"É preciso ser forte, antes de tudo, para enfrentar o bicho-papão que se esconde debaixo da cama" (L. Carlos. professor)
Hoje, em
tempos pandêmicos, nos quais entes queridos se vão como neve ao alvorecer do
verão, se foi meu irmão, tão forte quanto rochas, tão alegre quanto uma
criança, a acrescentar mais uma alma ausente, após outras que se foram em
tempos não muito idos – minha mãe e meu irmão mais velho – para a dor de uma
família que, naturalmente e ao passo infelizmente, acostuma-se com
quintessência da alegria e o submundo da tristeza, ou mesmo em sua potência
maior.
E agora,
escrevo este pequeno texto, enfim, para falar um pouco a respeito de uma outra
potência, que vem, que deixa, nos rejuvenesce, nos envelhece, envilece, nos
oferece, retira, nos une, nos separa... E sorri ao fundo, tal vilã de um crime
que já sabíamos que um dia seria cometido... Porém, do qual jamais nos
acostumamos – É o papel das potências, das grandes ondas ocultas, sobre as
quais nada sabemos.
SEM a vontade humana, ou mesmo da simples oração,
ela, a grande ONDA, vem em nome dos mistérios, desmistificando padres, bispos,
anciões, falsos mestres, sacerdotes modernos, até mesmo o mais fervoroso dos
fiéis. NÃO adianta, ela simplesmente vem.
Uma grande
onda a desfazer nossos feitos, nossas uniões familiares, sociais, religiosas,
idealísticas, filosóficas, como um vento que não cessa, sem observar lágrimas
ou filhos de pais ou mesmo mães, sem filhos.
NÃO existe
culpado ou inocente. Nem mesmo o pior
dos seres humanos, mesmo porque nosso legado tem sido não compreender a VIDA,
mas editá-la segundo nossos princípios, nossas normas, regras e organizações,
sem prismas míticos ou temperados E formulados pela grande onda – que não para,
não pergunta, não responde, apenas É.
Tudo em nome
de uma incompreensão massiva, de uma tentativa de redefinir o que somos, para
onde vamos, sem saber porque vivemos, amamos, nos jogamos ao próximo e nos
vamos sem saber do por quê dos seus motivos, de sua justiça, organização... da
própria onda.
É a vontade
pura. Leve. Brisa. Lua. Sol. Ar. Fogo. Água Oceânica, filha mais nova de um
outro mar, que não ousamos nem mesmo refletir a respeito, ou mesmo sequer temos
o grão de sal de sua existência, ou mesmo seu saber. POR ISSO, o fabricamos.
O saber em si é notório do ser humano, que possui em sua alma a
possiblidade de ascender às potências, de modo a rever, como um pássaro do alto
da montanha, a pequena presa que descansa no galho. MAS não precisamos buscar a
presa, e sim olhar para o mais alto ainda... A questão não se encerra jamais
pelo fato de que ainda que sejamos parte dela (da grande Onda), buscamos apenas
o que nos é inerente como humano – no sentido mais terreno da palavra... ASSIM
o objeto do sonho daquela alma sequer foi tocado, mas sondado pelo passado do
qual fazemos questão de esquecer... Passado precioso, joia de museu, palavras
belas e úteis, em dicionários esquecidos.
Saber, ainda ponte que nos leva a refletir acerca da ONDA OCULTA, de
seu papel junto à vida, portanto ao homem também. ONDA sem nome. Sem fé. Sem
razão. Sem misericórdia. Sem vestes. Onda que rege a todos e a tudo, até a si
mesma, nos faz livres e ao passo presos com suas grades redondas, celas em
espiral, com seus vermes sorridentes, ou como dizem, anjos cadentes, tão sérios
e pendentes de história e misticismo, ao tempo, cheios de pendências em
palavras que não se mostram e se calam, e ao mesmo tempo nos ensurdecem.
ONDA odiosa por nos levar a crer em homens vis, em pensamentos
racionais frios; onda bela e justa, por nos acrescentar a palavra morte, da
qual temos medo, e em outro contexto, a desejamos tanto... Em nos dizer com seu
ATO que somos finitos e ao passo infinito, pois nos faz buscar a riqueza cheia
de pesos e a outra, tão leve quanto à pena de uma pomba. Onda que nos
acrescenta mitos, cheios de dúvidas e certezas, que arrebata monstros, e nos
traz divinos; nos carrega como idosos, nos traz crianças; nos leva animais, e
nos traz humanos – tudo em prol de sua continuidade, para que possamos
eternamente indagar sua ida e volta, até que sejamos parte dela...
Enquanto isso, choramos e pedimos explicações em nome do que queremos,
fazemos e principalmente amamos.
AMOR
Compreender as partículas desse formidável ser sem nome, a junção de
cada uma, desde seus objetivos iniciais e finais, com o propósito de vivenciar
essa união tal qual são (talvez) o início do conceito de AMOR.
RESPIRAR esse ar, olhar as estrelas, sentir a joaninha roçar nos dedos,
perceber a função das folhas, da flor, dos líquens, dos processos que a
formaram, além das árvores, da comunicação sigilosa entre elas, do sorriso nos
galhos, além da sabedoria de seus frutos... Da terra horizontal que a ergue ao
vertical, para o qual sempre temos a chance de subir. Da bela rosa que, antes
de ir, nasce, cresce, se mostra bela em matéria e essência, tão rápido quanto
qualquer ser que tenta justificar sua moradia efêmera, entretanto tem o poder
de ser mostrar tão belo quanto à rosa, quando busca honrar sua existência em
virtudes, moral e práticas humanas, as quais são o princípio de uma reflexão
extramundo – quando regados de beleza e amor.
ANIMAIS
NÃO somos animais. Não estamos sós. SOMOS solitários em nossas cavernas
ôcas, cheias de sombras e fogueiras contrárias à realidade e a verdade. É por
isso que necessitamos buscar o que está além-religião, além-política,
além-vida, e se tivéssemos o talento de visualizar tais aspectos de maneira
frugal precisaríamos voltar à mentira e às sombras... Para isso, temos os
símbolos – como o sol físico, a água, o vento e até mesmo o fogo, todavia o que
nos faz mais próximos à onda é a regência de nossos instintos sobre os quais
não temos força.
...E a onda nos vem, e lá vamos nós, sem saber para onde nos leva, sem
saber por quê. Ao contrário
dos animais – que não precisam questionar a luz e a escuridão – e morrem feliz,
questionamos tudo, e nos vamos tristes.
Não precisamos da tristeza ou mesmo da alegria como âncoras, mas
vivenciar o que somos, no sentido mais pueril e divino, mais simples e complexo
da semântica humana, com finalidades conscientes, sagradas ou pelo menos, com
prismas sagrados, pois a onda nos envolve, e ao mesmo tempo nos retira de suas
margens, sem mesmo nos deter de seu grande manto oculto.
Não precisamos ser loucos, religiosos, filhos de entidades, presos a
dogmas, ideologias, tradições ou modelos que nos fazem bem. PRECISAMOS de nós
mesmos, no sentido mais belo da palavra, da música, do fogo em nossos
princípios, da brasa talvez como sólida partícula que queima em nossas
entranhas nos elevando a seres que devem trabalhar, e muito, para que não
sejamos levados e trazidos como turistas desavisados ao que sempre buscamos.
A ONDA não vai parar nunca. Seja em forma de doenças, violências,
pandemias, velhice, ou simplesmente em forma de nascimentos incessantes, dos
quais nem mesmo a metade conhecemos. PODEMOS, no entanto, trabalhar a beleza, a
justiça e o amor – novamente – em nós, com fins de enganar a onda, que sempre
acredita levar a todos como rebanhos cabisbaixos de um grande curral. E NÃO
somos assim, somos maravilhosamente humanos.
AO MEU MARAVILHOSO IRMÃO