sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

A Embaixada do Frio

A Batalha de Achilles
- III -





... E cambaleando em meus braços como um pequeno bêbado, arrastou seu pé direito no chão, junto com meus olhos consternados e alma refreada, até a suite. Nela, dentro do vaso, colocou a comida para fora, ajeitado fortemente sob meus braços, que seguravam aqueles trinta e poucos quilos de criança. Depois disso, pensei pouco, agi rápido, o questionando sobre seu corpo que não obedecia à situação. Ele não sabia nada, apenas tentava dizer algo, sob a fúria de uma veia que havia estancado dentro de sua cabeça, e nós não sabíamos.

Joguei-o na cama, como um boneco grande. Arrastei-o para a ponta, até que ficasse confortável, peguei meu celular, e loucamente liguei para minha esposa, que tinha ido trabalhar; gritei seu nome, implorei que viesse rápido e que deixasse tudo de mão, porque nosso filho não conseguia andar.

O mais engraçado é que ela queria que eu o vestisse, de qualquer  modo, para ir para o hospital, como se eu tivesse cabeça para tal aventura. Mas acho que foi delírio de mãe, não é possível! E ela chegou. Devia ter demorado uns dez minutos... (a primeira eternidade do dia). Pegou a criança, queria que ela se arrastasse, tentasse andar, falasse o que estava sentindo.... Mas Pedro, com medo do hospital, pairava entre o céu e o inferno, na tentativa de explicar-nos que estava bem,  porém, nada passava tão longe quanto isso. 

Minha esposa ligou para um de seus parentes próximos. Sufocada, chorando, pedia ajuda, pois seu filho estava arrastando-se e não mais andando. Desligou tudo, pegou-o no colo. Conseguimos descer as escadas do segundo andar, para o primeiro. Em minha cabeça pairava um breu de ideias que jamais pensei que houvesse possibilidades de acontecer. Eu não conseguia pensar em nada! 

Na frente da casa, na residência de minha irmã, pedimos auxilio a um dos meus sobrinhos, de vinte e poucos anos, mais forte que nós, o qual, de pronto, colocou Pedro dentro do carro. Lá dentro, meu filho fazia questão de tentar se exibir como menino forte, que estava bem, que tal situação não era tão dramática: seus olhos caídos exprimiam a natureza de alguém que tinha medo de pensar em algo mais forte, ao passo que suas pernas, presas uma a outra, juntas, tentavam se esticar, como prova de que estavam na ativa. Mas não estavam.

Em meia hora, chegamos ao hospital. Minha esposa pegou nosso filho no colo fortemente, deixando que sua sandália caísse na minha frente e depois por mim colhida até a recepção da Urgência. Nem sei que ela disse na entrada, apenas partimos para um consultório no qual havia um médico que, com seus olhos de lince, já avaliara o pequeno príncipe de longe. Mesmo assim, teve tempo de indagar a respeito do que houve, e tempo de ouvir minha esposa dizer que talvez tudo aquilo nada mais era que um medo generalizado que havia se formado na mente de Pedro, propagando-se pelo corpo...

Foi terrível. Nada disso, nem mesmo as dores de cabeça passadas, que um dia uma médica havia confundido com enxaqueca, fizeram o médico mudar sua ideia a priori. Pediu, então, que o colocasse em pé, e nada. Pediu que unisse as mãos, e nada. E assim, a primeira, das centenas de tomografias, foi solicitada...

Pedro foi colocado em sua cadeira provisória de rodas, sentou-se e, levado às pressas pelo doutor, acompanhado por nós, eu e minha esposa de perto, chegamos ao setor de Tomografias. Uma máquina que me parecia uma daquelas de filme de ficção na qual se põe seres de outro planeta para falar de seu planeta natal. Muitas enfermeiras. Minha esposa entrou na sala, eu não. Lá nosso filho foi deitado na máquina, com ar frio em todos os cantos. Um homem ficava nada cabine. E as portas se fecharam. Quando se abriram, minha esposa estava com um colete antirradiação, meio chorosa. O médico apareceu não sei de onde, mas, com um laudo na mão, andava mais depressa do que supus na ida. E quando tive ao lado dele, olhei para ele e perguntei... E ai, doutor, o que é?!... Com os olhos baixos e preocupativos, agora quase correndo, disse "AVC".

Meu mundo se foi.

(Continua)

FELIZ ANO NOVO!!!

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

"Quando se Pensa que se Sabe Tudo, a Natureza Muda as Peguntas"

A Batalha de Achilles
 -- Parte II -- 




Não sei quem disse isso, mas foi o que constatei na realidade a veridicidade dessa máxima. Uma daquelas que nos obriga a refletir assim que nos ocorre, que nos faz pés no chão e mais sábios. Foi essa impressão que tive quando meu filho, de nove anos, sofreu um aneurisma, consequente de um Acidente Vascular Cerebral (AVC), em outubro último. 

Foi de longe a pior coisa que poderia ter havido em minha vida (ou a de qualquer pai), desde que pensei em ter uma linda família, como a que tenho. Mas mesmo as lindas famílias -- ricas ou pobres -- possuem problemas, possuem maneiras de lidar com suas ferramentas e enfrentá-lo. No meu caso, foi uma das doenças que jamais pensei em ver em criança, principalmente a minha.

De viroses que dão dor de barriga a quedas, de tudo já passamos. A Natureza, como eu havia dito, me enganou. Deu-me um dos mais complexos problemas já trazidos ao homem moderno. A maioria dos pacientes, no AVC, ficam com sequelas, pois, a depender seu teor, atinge a parte direita ou esquerda do cérebro e também a maioria dos órgão externos, como um braço e perna, ou os dois. 

O Terremoto

Do meu filho foram os dois. Vou contar somente o superficial: meu filho estava pronto para deixar a virose que lhe consumia em dores na barriga. Foram dois dias tomando remédios caseiros. No terceiro dia, fomos obrigados a levá-lo ao médico, pois ele não aguentava mais. Ficou, assim, em repouso no próprio hospital, que cedera um pequeno quarto na ala das crianças.

Ficou bom. Fomos para casa. Ficou à base de remédios. Mas uma famigerada segunda-feira nos fez repensar o que somos, o que fizemos, para que viemos ao mundo e o que deixamos de fazer em prol de nossos filhos, e de nós mesmos. O menino de nove anos, que só tira nota dez na escola, que ama a todos em sua volta; que faz questão de ser criança; que ama loucamente seus pais e amigos, naquele dia sentiu uma dor feroz. Sua pequena cabeça doía fortemente e minha esposa acreditou que era enxaqueca, a dor que sempre dá em adultos antigos e em crianças modernas.

Deu-lhe remédios para cessar o mal. Não adiantou. Achávamos que, pelo medicamento dado, acabaria de imediato aquele suplício. Ledo engano. Peguei meu filho, apertei seu corpo contra o meu, pus minhas mãos em sua cabecinha, dizendo palavras de conforto... E nada. Uma coisa, depois disso, que jamais me esquecerei, acontecera: seus olhos viraram contra mim; suas lágrimas cessaram; sua voz, calma, não dizia nada com nada.

Sempre que conto esse episódio, meus olhos e coração se enchem de água. Ele, meu filho, estava tendo um rompimento de veia no lobo temporal do cérebro -- uma Amavi, segundo os médicos -- o qual, também, era responsável pelos movimentos do lado direito de seu corpo. Pedro não conseguiu falar, e quando o levei ao banheiro, a pedido insistente dos seus gestos... suas pernas estavam se arrastando, principalmente o lado afetado -- o direito.


(Desculpem-me, amanhã eu continuo)

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

A Batalha de Achilles




Em meio a dragões que nasceram
Como sóis salientes no espaço,
Minhas dores transpareceram,
Fiquei sem brio. Opaco.
Rajadas de fogo,
Tais quais vulcões do futuro,
Vieram em minha alma,
Tornei-me mais que impuro.
Meu corpo cansado,
Preso ao chão de meu Deus,
Refletia o que havia
Com o pequeno filho meu.
Me aprisionei entre o céu e a terra,
Nos quais em outrora,
Em súbitas horas,
Construí uma quimera do agora.
Não era o fim ou inicio,
Era em mim um rei patrício,
Destronado de seu reino,
Eram reais criaturas,
Nas escuras,
Em músicas obscuras,
Calando-me em meu leito.
Fui destruído, e minha alma, não.
Adestrada pelo espírito em ser forte,
Batalhou rumo ao norte,
E graças à divina sorte,
Venceu,
Elevei-me até os montes de minha janela,
E dela pude contemplar Deus,
Que sorria em pardais ligeiros,
Vestidos de simbólicos guerreiros,
Em nome do filho meu.
Não deixei  que relampejasse...
Nem mesmo chovesse,
Acendi as luzes da casa,
Cantarolei com lágrimas à frente,
Vesti-me como escudeiro,
Apenas para vê-lo sorridente...
O pequeno se levantou,
Partiu para a vida,
Como belo em guaridas,
E se fortaleceu.
Em pequenas iniciações ele renasce,
Se fortalece, cresce, aparece,
Brilha como o sol
E não desvanece.
Seu nome é Achilles,
Guerreiro perfeito,
Pelos deuses eleito

O melhor dos teus.



Feliz Natal!

A Parte que nos Falta

"É ótimo ter dúvidas, mas é muito melhor respondê-las"  A sensação é de que todos te deixaram. Não há mais ninguém ao seu lado....