domingo, 27 de setembro de 2020

Vivendo o Mito

Hoje, assim como muitas palavras, o mito se desfaz, se derrete nas vozes dos incautos professores de filosofia, como meras fórmulas teóricas decoradas com fins de dar sensações a estudantes da matéria. Em outras ocasiões, como já fora exaustivamente aqui comentado, a palavra mito vem perdendo (ou já perdeu) a sua essência. Antes, a significar algo mais profundo, mais universal, e humano, hoje, a palavra nada mais é que "um conjunto de narrativas culturais".

Isso nos faz invalidar, de alguma forma, o que era repassado, o motivo, o porquê da 'invenção' do mito, e assim por diante. Se não se sabe o valor do que temos, como iremos usá-lo em prol de algo? Nesse caso, o estrago é maior do que podemos imaginar. Se entendemos o mito como simplesmente um 'conjunto de narrativas culturais', como saberemos o real valor dele, como iremos saber o porquê que usaram, como usaram, e qual a finalidade?

O mito não é 'apenas' um conjunto de narrativas, mesmo porque não se cria algo tão belo e grandioso, que perdura há milênios somente com fins básicos. O mito nos impressiona porque tem algo de nós ali, naquela narração, naquele ser que defende, que ataca, que destrói, que constrói. Há algo de nós nos dragões imaginários, nos imensos lagos, oceanos, nas lutas, na profundidade da terra, quando relatada com forças divinas: somos a luta dos deuses pelo Olimpo, ou seja qual for o Mundo.

Entretanto, em detalhes se perde nossa compreensão atual, mesmo porque preferimos 'não ser' do que 'ser', graças a nossa parca compreensão natural acerca das grandes culturas que um dia relataram 'em mitos' o esforço do homem em encontrar-se consigo mesmo (ou como diria em nossa linguagem), com Deus. E não podemos negar isso.

O mito foi criado com a mesma finalidade de uma ponte, que nos une a um território desconhecido -- no caso, a nós mesmos. Não como uma faca, cuja a ideia seria cortar legumes, e depois, como uma peça chave de um assassinato. Seria reinventar um significado, ou melhor, dessacralizar o sagrado, diferente de profanar algo.

Mesmo assim, é preciso entender nossa maneira de lidar com algo que na antiguidade clássica era simplesmente (como posso dizer...) mais do que necessário a Educação do indivíduo. Fosse em academias, ou de forma peripatética, como Aristóteles ou mesmo Sócrates, os quais caminhavam por campos, ruas, vielas, sempre acompanhados de seus fiéis discípulos, e estes, quando sozinhos com seus filhos, introduziam o mito em suas histórias, fomentados do melhor mel, a essência.

De lá para cá, introduzimos o racional de maneira errônea, como se reproduzíssemos os heróis que já estavam lá com seus ideais, e até mesmo seus atos, suas roupas, seus monstros, como se fôssemos os 'inventores' de uma nova maneira de educar (ou informar apenas) nossos filhos. A partir daí, novas aventuras são contadas, novos personagens são introduzidos, novas histórias são contadas, de modo a fazer essa geração (que não tem a mínima pretensão de saber a verdade) acreditar em um novo 'algo', ou como diria... Em uma nova narrativa sem qualquer objetivo. 

Assim a ponte se desfaz.



Volto daqui a pouco.


Um comentário:

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