quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Presente de Anjo

Obrigado, filhão.





Ainda ontem fui presenteado pelo meu filho com uma pequena pasta, cheia de exercícios que fizera durante o ano inteiro. Eram pastas, na realidade, que continham deveres – como ditados, pinturas de desenhos didáticos, enfim, tudo que uma criança de primário tem como obrigação de fazer, e ele fez da melhor maneira possível.

Por que ele fez isso, me dando como presente? Meu filho tem um pequeno problema de inteiração com as pessoas, e por isso claudica um pouco nas palavras, nos atos e fica recluso quando pequenas coisas lhe acontecem. Mas ele sabe que nós dois, o ano inteiro, juntamente com sua mãe, trabalhamos esse lado dele, por várias vezes, e sabíamos que não seria fácil, principalmente a ele, que, assim como pai, de vez em quando sabe que o mais certo é ficar sozinho a digladiar em meio a palavras maldosas, sem sentido...

Contudo, ele, com seis anos de idade, teria que iniciar um processo de fala, de integração o mais rápido possível se quisesse criar alguma catapulta para seus sentidos, e conseguiu. Naquelas páginas que me presenteara, cheias de palavras bem feitas, de ditados com palavras corretas em cada sequencia, Pedro dizia... “obrigado, pai”.

Mais que isso, saltitante, por conseguir lidar com seu jeito menino de encaixador de palavras rápidas, porém com algumas consoantes mal fadadas, meu filho mostrara que nossa didática, nosso jeito pai-e-filho funcionara muito mais que professor-e-aluno, que colégio desestruturado versus revolta, que doença versus objetivo, que tudo que um dia nascera para nos frear ao nosso ideal... Que era desfazer de suas pequenas desconfianças puras, de seu jeito irrefreável de ser nas horas do estudo, e transformá-lo em um menino falante, elegante, educado, e mais, que, entre os vinte pequenos alunos de sua sala, fora um dos três que soubera ler e escrever...

Eu, mais uma vez, lacrimejei. Mas desta vez, não muito. Lembrei-me de meu irmão, o que sobrou, que um dia, em sua sala de estar, emocionado, fora questionado por mim acerca de sua emoção que ali se mostrava tão clara... “É meu filho, o Bruno”, disse em prantos, “Ele é tão obediente, tão perfeito...”, e desabou a chorar novamente...

Naquela época, seu filho tinha a mesma idade que o meu, e eu, o mais jovem dos irmãos, guardei aquela cena até então, como forma de me precaver em relação aos filhos, os quais, em meio a elogios profundos, cheios de conotações maternais, paternais, nos aprontam muito, quer dizer aprontam muito... (ainda não a minha pessoa, mesmo porque só tenho o Pedro...).

Precaução por quê?

Depois daquele episódio, um drama à mexicana, muitos se fizeram. Mas dessa vez, com pimentas mais amargas. Houve uma série de infortúnios com muitos de meus sobrinhos, principalmente o Bruno. E após perceber que dentre os treze sobrinhos que possuo, ainda que alguns tenham nascido longe de mim, observei e ainda observo que nenhum deles escapa ao que faz, ou melhor, ao que não faz.

A maioria, cheia de desejos, desfaz de seu pudor antigo, cresce, desenvolve uma mentalidade além-pai, além-mãe, e outros, além-Deus, e acreditam piamente que podem alcançar o céu sem ao menos entender o básico da vida. O respeito.

É natural que cresçam, queiram ser independentes, que tomem conta de suas vidas, se alimentem do mundo, de suas informações úteis e outras, a maioria, inúteis, ajam como homens e mulheres, ou pretendem pelo menos, tomando suas cervejas, seus uísques, vodcas, se rebelando contra os pais, mas se esquecendo de que, se querem ser diferentes,  sejam coerentes. 

Meus sobrinhos, independência, na maioria dos casos, rima com inconsequência, demência, imprudência... Jamais com respeito!

Se houvesse respeito a si mesmo, entenderia que suas vidas nada mais que nuvens breves, e que quanto antes encontrarem um lugar ao sol – ou como diria dona Josefa, “se lutassem por sua sombra”, amariam, respeitariam e ouviriam a voz da vida quando em seus leitos estivessem lacrimejando de raiva dos pais...

E Hoje, após aquele presente de anjo que recebi, olhei meu filho, dei-lhe um grande abraço, um grande beijo, e a ele também agradeci porque sei que, depois de tempos, pude perceber que estou no caminho certo, e se Deus quiser, ele também.


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