quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

A Crença nas Palavras

Opinião




Sem Palavras



Quem aprende as primeiras palavras, balbuciando as primeiras sílabas, unindo todas elas e perfazendo uma série de caminhos psicológicos, sabe o quanto letras, sílabas e palavras, ao fim, são  jornadas naturais pelas quais se passa – e para muitos, aventuras.

Nelas, nas palavras, que um dia foram monumentos naturais como expressividade humana e divina, nas quais, hoje,  formas revestidas de linhas e símbolos se perpetuam, tudo foi (e é) necessário para uma conexão com o outro e com o Todo.

E nós, ao abrir nosso órgão expressivo de voz, nossos pensamentos se traduzem – algumas vezes de maneira simples, outras complexas, no entanto, sempre com o objetivo de sintetizar o que sentimos ou o que racionalizamos em torno de um objeto.

E das palavras, ordenadas em forma de rima, tão complexas na escrita, com um ritmo acelerado, outras vezes lento, em suas junções, harmonizadas belamente por meio de sons, cantamos, e trazemos à tona, desafinados ou não, o que pensamos, passamos, ou mesmo a história de alguém, senão a nossa própria.

Aqui, traduções  de um coração magoado, de uma sociedade indignada, de um povo injustiçado, revelam mais, que chegamos ao nosso céu particular em minutos... E as palavras, mãe dos primeiros artifícios, são esquecidas, ou pelo menos seu papel. Entre loucuras abstratas criadas pelo pensamento humano, por sonhos jogados ao mundo, elas perdem seu valor.

Seu papel, filho das escritas cuneiformes, dos antigos sumérios; ou mesmo dos hieróglifos egípcios, haveria de  transmitir um universo maior que o de agora, que se resume em explicações eternas de algo que não nos interessa na maioria das vezes, e assim, por isso, não conseguem realizar o que há muito se conseguiu. Traduzir, por sua semântica, o papel do homem no mundo, ou interpretar uma natureza que se esvai bela e doce ao nascer na manhã, ao se ir na tarde plena de crianças nas praças e parques.

Não há palavras para sintetizar o que sentimos. Apenas um olhar como tentativa de elucidar os mistérios que se escondem por detrás da grande consciência, que faz questão de ser misteriosa em nome de Deus. Por quê?

Claro que há uma necessidade de traduzirmos tudo, mesmo porque somos céticos por natureza, e duvidamos até mesmo de nossa existência, se deixar. Mas não podemos encontrar termos literais a todo preço, simplesmente porque é impossível. E aí caímos em nossa indignação primeira.

Mas é preciso. Podemos, contudo, chegar perto do objeto, tentar clarear a bruma espessa que fora jogada de propósito pelos homens do passado e aprender que devemos deixar a rica bruma em seu lugar. Ou seja, nem tudo podemos interpretar, mexer, levar ao homem, pois há quem se beneficie de verdades para criar a sua própria, usando as mesmas palavras que um sábio um dia usou para nos trazer o conhecimento.

E as palavras, como símbolos perfeitos, como pontes naturais entre o universo e o homem, sorriem, trabalham em perfeita harmonia como formigas em nossa mente, cantam divinamente, acima de nossas cabeças, o som das esferas, de Pitágoras, das Musas, de Platão.

As palavras, em algum lugar desse universo o qual somente os poetas têm acesso, se reservam e se manifestam, ao ponto de criar meios de nos locomover quando citadas. São as palavras de fogo, quando vêm do coração em chamas,  as quais queimam o ser humano por dentro, dando-lhe motivos, e ao passo indignação com o Injusto.

Por outro lado, palavras há que descem ao rio, caem como folhas, e são levadas pela dor do grande mar que criamos. Tais palavras não nos elucidam nada, nem mesmo nos servem, são parcas de sabedoria, mas nos revelam nosso mais pobre ser, nossa alma envelhecida por nossas buscas vãs.

Eu fico com o silêncio das palavras. E as observo, encantado, seu valor como pequenas curvas que sintetizam a necessidade de traduzir o que podemos e sentimos, do cume de nossa maior montanha, e quem sabe um dia de nosso espírito.

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