O preço da queda: perder um dos mistérios da vida. |
Ontem, ao sair de casa, por volta das seis e quinze da
manhã, me deparei com cenas belas, ao olhar para o céu. Estrelas ainda
existiam, a lua ainda estava lá, e à medida que o tempo passava, a cada minuto,
um laranjado forte tomava conta das nuvens ao longo dos olhos. Era o sol
avisando da sua chegada. Era hora dos primeiros astros irem embora, de
mansinho.
Pássaros que dormiam, acordavam, e aos poucos, cantarolavam.
Nuvens se abrindo, pessoas saindo de suas “tocas”, carros educados, apesar das
pistas vazias, passavam a menos de sessenta, e paravam fazendo gestos com a mão, para que o
transeunte passasse sem problemas na faixa. O dia estava só começando...
Aos poucos, como a face de alguém por detrás das cortinas, o
sol surgia, tímido, como criança que boceja ao acordar, nos trazendo sua
mensagem de bom dia. E por ser o sol, por ser essa estrela milenar, muitos não
olham, nem querem saber, pois estão cansados de olhar para cima e se espantarem
com aquela beleza, que, para muitos, sempre foi a mesma.
Eu, fã incondicional desse deus antigo, digo-lhes, “nunca é
o mesmo”. Assim como nunca é semelhante à maneira como se levanta, quando se põe os pés no chão
quando se vem trabalhar; nunca é o mesmo sorriso do filho, da esposa – pois sempre
aparecem com um “quê” diferente... – e a esfera que alimenta a terra, quando se
sobrepõe aos pequenos astros brilhantes pela manhã, nunca é a mesma...
No entanto, os homens, não acostumados a vislumbrar as
belezas do próprio espaço que Deus lhe deu, observa o rosto dos outros homens,
critica-os, e vai ao longe em suas interpretações racionais. Assim, o
horizontalismo toma conta das vidas diárias que se alimentam de trocas de
diálogos irrelevantes, na tentativa de encontrar algo que os incite... Isso,
com um sol que nos pede, o tempo todo para elevarmos nossas consciências, e
buscar, verticalmente, nossas soluções diárias.
A solução não chega, e penetramos nas esferas mais sombrias
do ser humano. Aqui, nesse pequeno contexto, relevam-se buscas por sangue, por
violências, por palavras chulas, pelo pequeno desrespeito que, no mais tardar,
tornar-se-á dor. O próprio Hades
desaparece dando face a outro mais obscuro deus, o do Egoísmo.
E deuses das profundidades se tornam homens, tomam pessoas,
fazem-nas acreditar no mal revestido de bem, tão refinado e elegante, que seus
olhos, ao penetrar naquelas almas tão simples, congelam a todos, petrificam,
assassinam seus seres, tornando-os vegetais ambulantes.
E descemos. E chegamos ao mais violento do ser. O ser da
revolta. Revolta pelos sistemas, pelos homens, por Deus. Aqui, nem mesmo o mais
belo pode ser distinguido, pois perdemos a direção da essência – nosso caminho.
Não há ninguém que nos faça voltar, nem a melhor das experiências, nem a
presença furtiva de um mistério sagrado ao lado, vai fazer a uma dor se
extinguir. É o rancor na alma.
Como diria uma grande amiga, “dores físicas passam, cicatrizam,
mas quando se machuca a alma, a dor nunca passa”. É uma outra violência que se
aloja, primeiramente, em nossos racionais, ou seja, em uma mente cansada de um
mundo que está em decadência, principalmente em termos religiosos. Uma mente
cansada de ver e ouvir homens que se julgam sacerdotes a transformar o mundo em
uma jaula de interesses, a partir de escrituras clássicas. Cansados de ouvir
que a política é um meio natural de escolha para uma vida melhor, a partir de
homens que nunca tiveram nada ou de homens que sempre tiveram tudo, e querem
mais, custe o que custar...
O sol se foi, a sombra se funde com a alvorada; os
caminhantes aceleram o passo com medo dos homens, e as estrelas, mesmo assim, aparecem,
cheias e magia a espera de alguém que as decifre.
Nenhum comentário:
Postar um comentário