sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

O Último Voo de Falcão (?)

Falcão preso. Momento raro.




... Falcão cresceu, e enlouqueceu a todos. Depois de rasgar redes de pano, saias de mulheres estendidas, correr com panos de chão na boca, a picá-los com a facilidade de um moedor de carne canino, Falcão me surpreendeu com sua energia que não parava de crescer. E como todo criador de cães em espaços reduzidos, pensei em adotar táticas tardias, mas válidas a partir de técnicas arcaicas... Ou seja, comecei a andar de cajado!

Foi a pior ideia de minha vida, na criação de cães. Acho que nem mesmo meu pai, que detestava-os, não incriminava tandos os bichos, os quais só estavam fazendo o seu "trabalho"...A liberdade dele era total, por fim, tomando conta das situações, até mesmo na hora de comer, sair, fazer suas necessidades, de modo que as coisas me pareciam fora do controle...

Mas não é bem assim. Comecei a lidar com um aspecto formal, instintivo, como um cão também, a raciocinar como ele, e vi que ele precisa de ajuda. Precisava de carinho, de colo, de amor. E comecei a me aproximar dele, como um pastor do pastor. Ele assim me reconheceu como seu amo e senhor -- o que significa isso?

Tudo que ele fazia, tudo que ele pensava em fazer, olhava para mim, com sua calda louca a bater nas muretas, nas paredes, a sorrir energicamente para soltá-lo, para correr com ele, sair, e viver a vida que ele "pediu a Deus". Não era bem assim....

As coisas começaram a sair do controle em minha vida pessoal e conjugal, e minha esposa começou a acreditar que a relação entre mim e ele estava ficando mais estreita, enquanto a minha e a dela... Bem, o que quero dizer é que, ainda que um casal não tenha aquela afinidade toda, um dos dois, por mais bobo que seja, sente a vontade reclamar com alguém, e ela não tinha mais ninguém, depois que o cachorro começou a ser o número um, e ela o número três, porque meu filho era o dois...

Falcão se tornou um dos maiores cachorros que já vi da raça pastor; porém, sua idade mental não acompanhava-o, e voltava com suas brincadeiras, com sua alegria de dar medo nas crianças, nos adultos, nas pessoas de fora, quando eu passeava com ele (sem coleira!); e por isso, hoje, me arrependo. Não devia ter dado a liberdade que dei a ele.

Muitos me perguntavam, "qual a idade dele? dez, quinze...", e quando eu respondia sete ou oito meses, ficavam assombrados. Outros me questionavam como eu criava aquele cachorro, daquele tamanho, solto, sem medo.. "Eu acho que ele não faz mal a ninguém, ainda é muito criança, mas quando ficar mais velho, o coloco preso" -- foi outro erro grasso.

Depois de algum tempo, com seus oito meses, parecendo um urso, Falcão fez sua "última" retaliação (literal). Pela manhã, eu o soltava e na parte da tarde também; pela manhã, fora de casa -- e às vezes, de noite idem -- mas de tarde, era dentro do quintal, onde havia varais com roupas, jardins com plantas insipientes, cujos criadores -- não sei como, -- nunca levaram em consideração o perigo a correr com o "detonador" solto, e foi aí, nessa dubiedade de culpados -- eu, com o dog, e eles, pelo relaxamento natural, que aconteceu o pior.

Era mais ou menos seis da tarde, quando Falcão foi solto no quintal. Todas as roupas estavam colhidas, as redes, não havia mais; panos de chão, idem; chinelos, colhidos, mas as plantas... não. Um criadouro de plantas, cujas terras fabricadas " a la Globo Repórter " estava escondidas ao lado do famigerado jardim, ainda estavam lá...

Naquele dia, minha esposa disse, "deixa o Falcão solto um pouco, sem ser vigiado, de repente ele não apronta, porque ele já deve estar acostumado"... E eu, feliz pela ressalva do "acostumado", deixei. Lá no fundo do meu coração bateu-me a esperança de um mundo melhor, de uma raça bendita que perdoa o mal e o direciona para o bem! 

Realmente eu estava ficando feliz ou louco... E o deixei solto.

De repente, um berro "Nãaaaaaaaao!!!"... Com o berro de um leão magoado, preso por um prego na pata, Era o dono do experimento. Nunca o tinha visto daquele jeito. Louco de raiva, queria bater no cachorro, empurrando-o para longe -- Falcão o adorava, até então... -- pegando suas plantas na mandíbula do cão, estraçalhadas, acabadas!

Minha esposa quis intervir em favor do cão, quando foi em vão. O menino, que não sabia nem mesmo porque cuidava das plantas, não sabia nem mesmo se gostava de cães, sem qualquer objetivo definido na vida, ofendeu outra fera... a minha mulher.

Assistindo a tudo, sua fúria, suas palavras mal colocadas de sempre ("é uma desumanidade!", dizia ele, mesmo sabendo que cachorro não era humano...), percebi que sua loucura fora longe demais. E coloquei Falcão para dentro de sua casa, sem bater nele, claro. Após, coloquei expressões do tipo "não adianta plantar se você não respeita as pessoas" -- "Não adianta trabalhar a terra, se você não trabalha a si mesmo" -- "Não se pode ser teórico em educação, se você não respeita ninguém nessas horas".

Acho que fui a fundo demais em minhas palavras, de modo que depois percebi que tudo que falei foi algo "pérolas aos porcos". Ele não entendia nada. Eu devia ter chamado a polícia! Calma, mentira. Eu conhecia a pessoa. No fundo, um garoto perturbado pela carência de pai, mãe, irmãos, amigos, que busca um caminho na religião, em uma educação diferente, em modos práticos quando dele precisamos, mas só.

Esse mesmo garoto, sem futuro com a terra (plantas), já pensara em se matar. Negro de nascença (uma das qualidades desvirtuadas por ele), não consegue lidar com sua cor, com sua inteligência, com seu mundo social, e tenta se socorrer junto a ele mesmo.

E quando o cachorro acabou com suas plantas, chorei um pouco. 



Volto no próximo texto...


quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

"Falcadas" no bolso



...Depois daquelas explicações a respeito do meu cão, nunca mais as esqueci. Por volta de uma hora ouvi tudo sobre os cães pastores, sendo suas manias, seus modos, brincadeiras, crescimento, além do que come ou não come -- o que na realidade se contrapõe com o que se pode comer, ou seja, o próprio cachorro faz sua tabela nutricional, deixando claro que, até mesmo sua vontade, instintos são direcionados também à comida.

Falcão comia de tudo! Contudo eu tinha que desviá-lo do tudo e levá-lo somente à ração, caríssima, a qual geralmente faltava em pequenas Pets, ou grandes, mas eu tinha que encontrar porque, segundo o ex-dono, se eu quisesse manter o cachorro, o pê-lo do cachorro, ou mesmo a latido do cachorro, teria que gastar com rações "tops"!

Minha irmã, que mora perto de minha residência, morria de rir, dizendo que iria dar ao meu dog arroz, feijão, cuscuz (mingau de milho), junto com rações normais -- daquelas que não precisam nem olhar quando se está comprando. E eu, com meu olhar quase canino, já deixava bem claro que não era um vira-lata que estava sendo alimentado -- em referência aos cachorros dela, que, apesar de serem de raça (um Chow e um Cock Spender), eram mais cobaias do que cães.

Mas ela tinha razão numa coisa, era preciso saber lidar com ele, com a raça pastor, caso contrário, eu também iria alimentá-lo com mingau, e isso eu não queria. Mas não deixei a peteca cair, ainda que nosso meio (social) não era tão benevolente para a criação de cães daquele porte, 

Mais tarde, ele foi crescendo, e pude retirá-lo do casulo (área de serviço), e o levei para um local que já era dele antes mesmo de chegar. Um corredor pequeno, com chão a cimento batido, sem proteção interna, e que só um portão o separava dos demais (esse portão tem mais histórias que esse cachorro...). Mas pude ver que ele se sentia já independente, mas sozinho, sem os carinhos do meu filho, e longe dos berros de minha esposa -- talvez por isso a mudança precoce.

A vida dele, a partir dali, se tornou um céu para ele, e para nós... não.



Volto com o último texto.


terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Falcão nada Azul

Continuação: "Um Ano de Cão"

Falcão, com seis meses.


Alguém se lembra daquele desenho animado maravilhoso em que um homem vestido de pássaro e seu cachorro ciborgue combatiam o crime? Falcão Azul e Bionicão! Oh, saudade! Mas o meu Falcão, cachorro, não tem nada de azul e não combate qualquer o crime, mesmo sendo um cão polcial. Muito pelo contrário. Ele provoca a ira humana até fazer da gente assassinos de cães!

Mas isso está longe de acontecer, claro. Foi apenas uma maneira de dizer o quanto ele tem dado trabalho. Normal, como dizem os "especialistas" de plantão, assim como os de vinho, que não bebem, e se sentem o máximo, apenas com uma taça na mão. É o início de um fim de um tempo em que fazíamos a questão de dizer "só sei que nada sei", mesmo sabendo algo.

Deixando de lado os racionalistas, vamos nos ater ao dog que levei para casa com três meses. Um cãozinho que, como diria as crianças mais atentas, por analogia, "um Taz"!, mais uma vez me deslocando ao passado dos desenhos de Hanna & Barbera, os quais eram os melhores do mundo. Sim, Falcão nos parecia um demônio da Tasmânia, a rasgar tudo, a levar tudo, e sorrir com seu rapo grosso a deixar a todos em pane.

Minha esposa, que fora desde o inicio contra o projeto adotarmos um cão, estava à espreita em todos os sentidos, sempre a denunciar o pequeno rasgador de panos. Mas não tinha jeito, depois de o colocarmos em uma área de serviço, provisoriamente, ficamos com receio de acordar com todas as roupas, inclusive a dos varais internos, detonadas, o que era uma realidade...

Porém, isso só vinha a ocorrer com aquelas que estavam no chão, e nós, que não tínhamos conhecimento completo da natureza do pequeno demônio, esquecíamos de vez em quando, e aí, dá-lhe reclamações em minha cabeça.

Se fosse somente os panos, eu ficaria feliz, mas Falcão me impressionara com sua força, ainda com três meses, e amarrado a uma mesa com pernas de ferro, sustentada por uma pedra retangular de mais ou mesmo um metro e meio, a pesar mais de trinta quilos, a arrastava fogosamente... Dava medo, confesso.

Mais tarde, Falcão viria a fazer suas necessidades... E adivinha... Não dava um tempo! era praticamente a cada duas horas! E isso me incomodava, me deixava angustiado, com muita raiva, além, é  claro, das reclamações da esposa, que praticava seus melhores verbetes em minha pobre pessoa...

Eu não sabia quem eu matava.
Meus pensamentos, graças a Deus, foram substituídos pelas máximas dos grandes homens que viveram suas vidas em prol da humanidade, em prol de tudo que é vivo, em nome de grandes ideais, dos quais jamais deixaram sair de seus espíritos. E Falcão, penso, no início, foi fruto de meu vaidosismo, de minha vontade pessoal -- não ideal -- em ficar com um cachorro bonito que espelhasse meu modo de vida -- e isso me deu medo de novo --, além de tentar resgatar minha alta estima junto a mim mesmo, porque sempre penso que nada é possível a mim, limitado por natureza... (mas quem não é, certo?).

Transformei com o tempo, aquelas reclamações, em forças para trabalhar em prol de um ser vivo, que, com certeza, me faria (um dia) um grande favor. Assim, até então. Minhas forças, porém, se perdem e se atrofiam com o tempo, e começo a ouvir ruídos fortes do presente (reclamações!), fraquejando por vez.

O tempo foi se passando. Falcão só se especializava em minar minhas forças, tal qual minha esposa, Alimentava-se de minha raiva, mas eu sempre voltava meus pensamentos aos meus lobos internos, os quais somente os bons eram alimentados, não os maus. E por falar em lobo, o pequeno dog não estava mais com cara de três ou quatro meses, mas de muitos meses, o que fazia as pessoas me afirmarem "Você não vai dar conta dele". 


Parecia-me um futuro incerto e ao mesmo tempo obscuro, contudo, eu contava com meus ensinamentos -- mas só depois fui ter a certeza daquela expressão nada amistosa. 



Continuo no próximo texto.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Um Ano de Cão

Falcão, com três meses.


...O título é uma brincadeira com o filme "Um dia de Cão", com El Paccino, que não tem nada a ver com minha história que contarei aqui. O título, "Um Ano de Cão", é uma homenagem que faço ao meu cão pastor que completara um ano este mês, e que não vai deixar saudade a muita gente da vizinhança...

Falcão, nome que dei a ele, graças a meu filho e esposa que estavam inspirados, foi comprado pela internet. A foto do bichinho, nos braços do dono, e mais uma dele correndo nos gramados me deixaram sensibilizados como amante de cães de raça que sou -- principalmente da raça pastor. E depois de um resíduo que entrou no meu contracheque, não perdi tempo, marquei com o rapaz e fui visitá-lo num sábado, junto com outro colega.

Depois de ter recebido do ex-dono todas as instruções relativas à raça, fiquei pensativo. "Será que ele não está exagerando?". Meu amigo, com qual fui buscar o dog, olhou para mim, balançou a cabeça e já com Falcão nos braços, sorriu, como se dissesse "Toma! Agora aguenta o tranco!". Mas se bastou em dizer... "É, amigão, não vai ser fácil!".

Fiquei apreensivo, triste, mesmo porque eu estava com um cão com um pedigree acima da média. Os pais daquele ser de três meses, pequeno, fofo, peludo, bagunceiro e com olhos doces, foram campeões brasileiros em várias competições. Fiquei pasmo com minha responsabilidade em comprar um cachorro daquele porte e que poderia, a depender de mim, um fracasso.

Mas, depois, me questionei: "por que que esse cara está falando isso tudo -- levou pelo menos uma hora só falando dos cuidados com o cachorro! -- se sou eu quem vai cuidar dele, dentro do que posso??"... Mas fiquei calado.

Enfim... levei-o para casa. A figura linda do cachorro conquistou a todos. Não sei se realmente a todos, mas aparentemente sim. Vi olhos felizes, dentes amarelos, cabeças virando para um lado, pessoas o querendo pegar, ou seja, de tudo me passou pela cabeça... Contudo, o que mais me fez feliz, e o que mais me fez e me faz cuidar dele até hoje é meu filho.



Continuo mais tarde.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Solidão, Solidariedade, ideais...

"Não vou me deixar embrutecer, eu acredito nos meus ideais. Podem até maltratar meu coração, que meu espírito ninguém vai conseguir quebrar"

R. Russo







As duas possuem radicais idênticos, porém não semelhantes quando levados a analogia por meio do latim. Solidão vem de solus, só, sozinho; solidariedade, do latim solidus, firme, forte, ou seja, analisando friamente, com nossos olhares duvidosos em relação aos seus significados, não têm nada a ver uma com a outra, correto? - correto.

No entanto, se analisarmos filosoficamente, de maneira que tenhamos as duas em mãos, no sentido de tentar encontrar uma linha imaginária que as faça religar uma com a outra, podemos sim. Mesmo porque, semanticamente, todas as palavras, a depender do contexto em que se encontram, podem se ligar e dar significado completo ao que nos referirmos.

Nesse caso, para dar sentido aos dois termos, temos que falar de um terceiro, de um que tenha a natureza maior, mais forte e que se tangencie, mas não muito, do significado das duas -- solidão e solidariedade. Essas duas, imaginem, em seus lugares opostos, e a terceira a qual vamos nos referir ficaria acima das duas, como que finalizasse um triângulo.

Falemos do Ideal

Uma palavra que é confundida com idealismo relativo, cheia das amarrações em projetos, em consecuções naturais do homem moderno em aprender algo, ou buscar algo que lhe interessa, de modo a resolver suas pendências materiais ou psicológicas, nunca espirituais. Grande erro.

O ideal está acima do homem, e dentro dele. O ideal, como diria um filósofo moderno, com vistas à tradição, "O Ideal pode ser encontrado em uma borra de café". E entender que nesse ato simples podemos vê-lo e contemplá-lo, ter pelo menos uma visão do que pode ser, já seria de bom grado à nossa espécie, mas não somos presenteados com essa visão, ou somos e não temos tempo, assim como aquele rei que procurava pelo graal loucamente e acabou descobrindo que estava a seu lado.

O ideal faz isso conosco, nos chamando todo o tempo, sempre nos levando a acreditar que podemos ser humanos, no sentido mais belo da palavra, porém, com a desvirtuação natural de conceitos sagrados, como o da própria solidão, sobre a que já falamos, ficamos um pouco distante do que podemos saber e do que somos.

Voltando à solidão...

Depois de refletir acerca desse mundo, das pessoas, dos sistemas, dos conceitos profanos que nos atordoam incessantemente; depois de entender que a vida nada mais é que uma junção de teias naturais que nos emendam,  e que precisamos ter o mínimo de sabedoria para compreender o que somos dentro desse meio, nosso papel, ideais (!), levantamos -- na prática -- e partimos com a firmeza de um guerreiro em função daquilo que podemos mudar. Aqui cabe, enfim, a palavra Solidariedade.

Nessa ligação, que não pode ser construída sem valores, sem a internalização, sem amor, sem a vontade divina, a firmeza em uma personalidade refeita se religando vem como a concretude de um homem que sabe mudar seu mundo, por meio de atos simples -- não novos --, os quais são renovados a partir de uma dedicação além corpo -- aqui aparece o Ideal.

Feita a triangulação, naquele pequeno ato, ou em atos consecutivos, porém ainda mais simples, sentimos a realização em nossa alma, em nosso ser. Levamos a diante, persistimos, não deixamos cair, e prosseguimos como se fosse uma batalha, ou mesmo uma grande guerra -- mesmo porque lutar contra opiniões, conceitos arcaicos, vãos, renovados por estruturas frias, com vistas a matar o real homem em nós, é algo que nos faz mais determinados a viver para sempre em nome desse mistério.

Esse triângulo deve ser mantido em nós.



segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

O Homem na Solidão



A solidão é uma ferramenta ao homem como o martelo de Thor o foi para o deus nórdico, um adjunto que, sem ele, não iria a lugar algum. Um brinde da Natureza, um linha com a qual nos comunicamos com os deuses e conosco mesmo. 

Platão, filósofo grego, tinha razão quanto ao ócio -- a velha forma de solidão, que entendemos atualmente como um estado apático, estático, mórbido até, sem finalidade alguma --, que nos faz refletir junto ao nosso universo esquecido, e nos faz repensar o real mundo. E por isso, dizia, "Um homem sem reflexões não merece viver", e isso vai ao encontro do que somos e pretendemos ser dentro de nossas ideologias, sejam elas partidárias ou não.

Contudo, quando nos referimos ao ócio, dentro da ideologia platônica, falamos de algo maior, transcendental, que tenta alcançar o deus em nós, o Nows. Por meio da reverência aos deuses, do misticismo direcionado ao sagrado, da sacralidade máxima que nos fará mais tarde um homem virtuoso, moral, ético, com atos que brilhariam tanto quanto uma estrela na noite,

Entretanto, para aqueles que persistem na solidão bastarda, filha do nada, gerada pelo ventre do ninguém, desfaz, psicologicamente, seu papel, peço que, persistentemente, iniciem um processo de resgate de seu valor, a fazer com que se sinta levado a buscar a solidão em seu sentido mais sagrado, mais divino, ou seja, buscar tal conceito e fazer dele seu ninho, sua refeição diária, com fins de trabalhar suas causas internas ou como diria o próprio Nietzsche, "para que tenhamos uma visão diferente da massa que vai e vem",  não somente por isso, mas para rever nossos conceitos acerca de tudo, mesmo porque estamos não somente partilhando conceitos novos e ruins, e inventados, como também deteriorando os velhos e bons conceitos, como coragem, amor, verdade, moral, enfim, praticamente todo..

Não precisamos ficar sozinhos, mesmo porque não é fácil. Mas desviar de determinados assuntos que colidem com o mal, com aquilo que nos separa de nossos objetivos, ideais, enfim, de Deus! vamos ficar mais presentes e mais atentos ao que fazemos e falamos, e colhemos. Vamos, em nosso íntimo, refletir sobre o mundo atual, e quando não encontrarmos a resposta, levantemos de nossas cadeiras, e iniciemos um mundo novo, sempre com vistas a levar a humanidade conosco...





sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

A Solidão no Homem

"Enquanto não atravessamos a dor de nossa própria solidão, continuaremos a nos buscar em outras metades. Para viver a dois, antes, é preciso ser um."

Fernando Pessoa





Muitos chegam a dizer que é o mal que assola nosso século, e por isso a chamam de doença. Uma doença natural daqueles que odeiam multidões, perseguições psicológicas, e que têm medo do mundo e da vida. Assim, presos a sentimentos como o medo, o qual mais tarde se assoma ao desespero, torna a solidão uma ponte para uma tragédia... É a realidade de muitos.

Outros, em meio a insanidade política na qual se encontra o mundo, tentam refugiar-se em si mesmo, sem pensamentos construtivos, sem objetivos que o façam reerguer-se por falta de idéias. Sem falar naqueles que se julgam minorias, graças a uma sociedade que se julga -- dentro dos parâmetros robóticos, sem sê-lo -- perfeita, sem problemas, sejam eles físicos ou não. E aquele, mergulhando em si mesmo, com vastos preconceitos embutidos pelo pragmatismo humano, não consegue extrair de seu "martírio interior" força para sair dele... É a solidão, mais uma vez, usada como ponte para a confecção de abismos.

A Solidão de Nietzsche

... Para o filósofo alemão, a solidão ocidental, vazia de sentidos, desencoraja os indivíduos à moral natural à qual se tem direito. A solidão  para Nietzsche teria que ser voltada para a virtude, para a moral. como uma consequência natural do crescimento humano, em busca de valores os quais a própria sociedade, com os seus gregários, se separa de si mesmo. Muito pelo contrário até. Se distancia de soluções para o próprio homem. 

A necessidade da solidão, segundo o filósofo, tem tudo a ver com liberdade, ou seja, com a busca divina em si. Não se pode falar em liberdade, sem solidão, sem tentar reconciliar com leis internas das quais o próprio homem no passado, em forma de conhecimento, sabedoria, conseguiu nela o entendimento do universo.

É uma purificação. 
Quando nascemos, crescemos e desenvolvemos nosso raciocínio em prol de uma sociedade fria e sem soluções, nos distanciamos de nós mesmos, da sabedoria, e mergulhamos em opiniões que geram mais desconforto em nós. Mas não paramos, e desenvolvemos projetos, com idéias sem nexo, sem sentido, nos proclamando idealistas de um novo mundo. 

Sem nos conhecer, sem a busca natural de uma moral transcendente, dentro da qual encontramos não somente a solução para o homem, mas também para muitas doenças, não podemos mergulhar em projetos, em ideais falsos. Ele, esse ideal, dorme em nós como uma criança que quer ser lembrada, e só assim acordará e será nosso guia nas horas de ócio.

Não podemos, por isso, como verbaliza o filósofo, "ser adestrados" pela massificação dos conceitos que nos levam como carneiros à tosa. Temos que repensar o que somos e para onde vamos, tomar iniciativas, sempre dotadas de moral, virtude e muita espiritualidade. Vamos nos aproximar de nós mesmos.

Em seu livro, "O Anticristo", o filósofo alemão nos faz subentender que a moral do rebanho (povo) tem a sua realização em Deus, motivo que deixa alguns domesticados e adoecidos, por temerem a grande sombra do homem, que se aloja no meio do céu, a os vigiar eternamente. A morte de Deus, disse ele, seria a melhor maneira de lidar com a solidão, pois abre ao ser humano a oportunidade de reconquistar a si mesmo, a liberdade, a moral, a virtude... Conhecer a si próprio.

Para Platão

Platão falava do ócio, não da maneira como o vemos, mas um ócio voltado a repensar nossos valores, nossos ideais, em uma hora do dia exclusiva para isso, E a solidão, como diria, faria parte desse ócio como a forma principal para desenvolver pensamentos com vistas a se conhecer. 

O filósofo grego falava em contemplar a Beleza em si, trabalhando a matéria prima, que seria o próprio indivíduo. Falava em refletir acerca da Verdade, que seria uma pedra bruta dilapidada aos poucos até se transformar em algo visível, em forma de atos. 

Dizia que o o homem virtuoso bastava a si mesmo. E hoje, quando nos remetemos a frases como essa, percebemos que há algo de errado quanto ao que o filósofo quis dizer, isso se observarmos com os olhos de uma sociedade que não se basta, sempre se quer estar acompanhada, cheia de amigos, parentes, pessoas de diversos tipos do seu lado, ou seja, medo de estar só (solidão vem da palavra (l)sulus, só), sem ninguém. Solitário.






Continuamos no próximo texto.








A Parte que nos Falta

"É ótimo ter dúvidas, mas é muito melhor respondê-las"  A sensação é de que todos te deixaram. Não há mais ninguém ao seu lado....