sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Caçadores de Sonhos

Verão chegando depois de uma primavera chuvosa, que nos adentrou em ensinamentos próprios da grande e bela estação. Apesar das frestas por onde caíram as águas chuvosas, raiventas, dos alagamentos em cidades, em vilarejos, em casas, na minha casa... Fomos purificados pelo arrastar de uma energia que respingava em nosso corpo quando saíamos para a rua, pois nos pegava de surpresa -- ou não, o que nos fazia mais precavidos, e por que não dizer menos medrosos, enquanto nossas calças e sapatos eram molhados lindamente nas poças que se acumulavam nas ruas...

Perguntávamos "quando você vai parar, ó bela chuva"?, e nos tolhíamos a viver adentro de nossas casas, a nos questionar o porquê daquelas águas, daquele frio, daquelas dores que se reuniam na alma, quando os pingos batiam no amianto... Quando a profundidade de nossa fé se revelava rasa. E descobrimos que não éramos heróis, mas seres comuns, que resmungavam desde o início, pois não era a chuva a real vilã dos homens que amavam o sol, mas nós mesmos, filhos de uma natureza que não se conforma com a Maior, que ordena, que anda, que vibra, que perpassa todos os valores humanos e cria o seus.

O problema é que não sabemos refletir nas horas em que somos compilados a fazê-lo. Sentar-se, orar em prol dos homens, de nossos atos em relação a eles, de uma vida que ainda precisa de muito para se conectar ao grande Mar, e este ao grande Oceano Vital, do qual se nascem seres de todos os mundos e com eles estamos no grande Infinito.

Não é preciso, no entanto, se afastar em pensamentos, como que fôssemos meninos em busca de um brinquedo em sonhos ou em uma aventura que não o deixa acordar. Não. Como diria Nietzsche, buscar o que não buscamos, entrar em nossos pensamentos em nome de nós mesmos, não de criaturas inventadas com fins de nos dar medo; somos a criaturas, somos o criador, somos a fera e possuímos uma alma bela, a qual subjaz ao nosso mais íntimo ego pessoal, sobre o qual falamos e inventamos modas o tempo todo... 

Este, contaminado, friamente se vê o quanto está errado e caminha em função de algo mais forte, mais sério e preponderante, assim, do nada, como mistérios se fazem nas obras do sagrado. A alma agradece, pois, por possuir uma natureza simples, e por isso pura e sem lisuras, imaculada e bela, se regojiza ao céu do espírito, ou em sua primeira visão, assim como um cego que há anos não vê o mundo, e quando o faz, seu primeiro momento é em frente a um belo pôr do sol.

Nada melhor do que buscar a vida na vida, pois como um dia disse um grande professor, "buscar goiabas em pés de goiabas, mangas em pés de manga", o que, para nós nos parece óbvio, para ele, metaforicamente e ao mesmo tempo transparente, uma contradição humana, que se debruça em busca de uma felicidade imaginada, relativa, pois se fosse esta menos interesseira, não buscaríamos em lugares errados, medonhos, assombrosos... Ela, a felicidade, se resguarda no simples, no agora e no amanhã.

Hoje, no Verão, agora um sol maravilhoso, que prepondera atrás das montanhas, das serras, em aparições tão gigantes, que nos tornamos mais insignificantes. Sua beleza, que gira em torno de uma filosofia sem palavras, nos faz colidir com o simbólico, com o mistério que se esconde em seus raios. Isso, como diria Platão, é só uma pequena ilustração do que é o Bem, pois nos chama a atenção para o que somos e podemos ser, para o que buscamos frivolamente ou mesmo de forma ardente, como caçadores de sonhos. E somos.

Nesse espírito ainda que simbólico, nesse fogo físico que nos parece eterno, nesse desaparecer de quietude, partimos para a parte prática, idealizando o que em nós havia adormecido, descansado, em meio às reflexões de outrora. Subimos montanhas, corremos em quarteirões, soltamos fogos, sorrimos, choramos e cantamos ao sol, tal qual nativos que nasceram perto de vulcões.

Desses dois elementos -- chuva e sol ---, que em nós se vivificam, retiramos o que nos é inerente. Desses seres que se adentram em nossos mundos pelas estações, podemos retirar mais que chuvas em nossas cabeças, que sóis em nossos corpos físicos. Podemos e temos que entender o porquê se repetem tanto e porque retiramos tão pouco deles quando aparecem.



FELIZ NATAL!!


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