terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Sonhos que não vão embora

De vez em quando me passa pela cabeça aquela imagem do menino que tomara banho em uma pequena bacia de plástico, protegido pela presença da mãe, que o amava tanto que achava que o dia não terminava nunca. O mesmo pensamento passara pela mente do menino, que batia as mãos na água, a derramar o líquido que não era tão precioso à época, e podíamos jogá-los ao chão imaginando figuras douradas com o reflexo.

Eu tinha uns sete anos. Com espírito flamejante, sorridente, só saía da bacia quando queria, e naquele dia, de tanto ficar, esqueci da aula, dos meus estudos, e acredito que minha protetora também. Isso me fez ir para a escola sozinho, atrasado, mas graças à minha popularidade, não me perceberam chegar e me enclausurar no meio de minha turma... E acho que a professora também não.

O tempo se passou, aquela criança se foi, minha mãe também. Os dois ainda burlam minha alma como uma brisa rastejante e fina, que me embriaga de solidão e paz, na medida que em passam em meus olhos internos. E por isso, lacrimejo nas vezes em que me lembro desse sonho que me passou.

Outros sonhos reais também se foram, como o assobio de minha mãe, o qual me confortava nas horas de desespero, nas quais minha vida, tão pobre e soleira, resumia-se em nada, apenas em ver tevê e assistir a pessoas felizes a correr em meio ao mundo como em um filme em preto e branco. Claro que nem tudo eu assistia. Muito pelo contrário. Participava, corria, buscava e tentava entender porque o dia terminava de tão bom que me soava aos olhos.

Uma dessas vezes era quando eu soltava pipa (ou papagaio) no meio de algumas casas de tábua, pois ainda não sabiam o que era tijolo, alvenaria, sei lá, além dos matagais que davam acesso ao chamado "morrinho", coisa que só 'rico' sabia. Como eu era bom nisso! eu tinha uma parceria, um sócio de codinome "Baú" (apelidado assim por ser feliz demais, e o Silvio Santos, apresentador, tinha o Baú da Felicidade!). Esse meu amigo, ainda o é, e a seus irmãos saíamos em busca de bambus, cortávamos a mão de tanto afinar varetas, e desenhávamos tantas pipas em nosso inconsciente, que cansamos... Mas antes de nos cansarmos, no enriquecíamos de tanto rir pelas brigas no ar, e na terra, em busca de pipas novas.

Sonho era ver um pai que, mesmo dependente de bebidas, se apresentava como um outro protetor, deixando o vício de lado para fazer carrinhos de rolimãs, dentro dos quais me colocava e pedia aos meus irmãos para me empurrarem. Coisa de louco! As ruas eram só descida, e quando não, me puxavam feito funcionários de empresa de seguros e me pediam para ficar no carro acontecesse qualquer coisa que fosse.

Queria contar um outro sonho porque passei. Isso inclui minha mãe novamente. Não me esqueço de sua canções e de seu perfume, de sua força natural e presença, combinadas a potência de seu sorriso, do teu amor que impregnava nossa casa. Poderia ser a pobreza que fosse, mas a sua presença nos enriquecia e nos alimentava mais que aos nossos corpos, simplesmente porque, quando íamos dormir, aquela canção nos adormecia somente pelo fato de existir nos lábios de uma mater a paz que já nos sossobrava o coração.

Hoje busco mais sonhos em meu filho, em minha esposa, que detêm a fé em mim, pois devo também ser  o sonho deles ou dar-lhes mais sonhos por meio da liberdade e da educação que a vida pede para dar-lhes. E tenho a certeza de que estamos no caminho certo.

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