sexta-feira, 31 de julho de 2009

Espelhos e Reflexos


Envelhecer é inato, é, além de tudo, preciso. Envelhecer no sentido mais sábio da palavra, que ainda busca algum significado (ou um verbete certo) para dizer que deixar de ser jovem não é morrer, não é deixar a vida solitariamente, ou mesmo fugir da multidão. Não. Não é isso... Não é deixar os cabelos brancos, como dizia Platão, “Cabelos brancos não são sinal de sabedoria”, mesmo porque podemos encontrá-la antes que isso aconteça, porém, sabedoria, no sentido menos exato, está somente àqueles que passaram pelas águas de uma grande experiência e que dela tiraram o sumo para uma vivência bela, mesmo e apesar dos trejeitos.

Envelhecer é sorrir aos adventos de uma idade que se está indo e nos indicando um sinal de beleza apesar de uma aparência que não condiz com o coração, cheio de sonhos. Mas nossos sonhos, principalmente daqueles que chegaram à idade da grande sabedoria, não morrem à mingua numa cadeira de balanço, em asilos, em jogatinas caseiras, em programas de auditórios televisivos, muito menos em novelas globais...

Nossos sonhos parecem começar a cada primavera, a cada verão, pois somos dotados de práticas internas nas quais somente nós sabemos de sua realidade. O sonho nos faz jovem, ainda aventureiros desmedidos, pois tudo que fazemos, apesar da forma física, querer voar acima de nossas possibilidades, por isso, surfamos, corremos, andamos de manhã, sorrimos ao sol, choramos com sua ida, dançamos com nossas parceiras, ‘uivamos’ à meia noite, cantamos nos chuveiro, cheiramos a terra molhada... E assim, trilhamos nossos sonhos, com a certeza de que estamos ladrilhando nosso caminho até o fim de nossa aventura.

Envelhecer não é chorar escondido, não é reclamar da vida, não é a aparência do espelho, não é nem mesmo a aparência que o mundo nos dá. Envelhecer é ser a cada dia jovem, no sentido de nunca desistir de ser um homem (ou mulher) idealista das coisas mais simples. Não é tentar igualar-se ao real surfista das grandes ondas, mas o surfista que dribla o rancor e tristeza, que, na idade vital, se tornam oceanos em nossas mentes. É tentar entender os mistérios de sua própria idade, à qual chegamos (querendo ou não), na tentativa de elucidar os mistérios do grande ciclo que forma em nosso corpo e em nossas almas, regidos pelo Grande Espírito.

Envelhecer é saber lidar com seus instintos, com seus desejos, e canalizá-los para o alto, para as esferas de uma realidade que deixamos de lado em nossa juventude agressiva e mal direcionada.

Quando nos olhamos no espelho, vem-nos o sentimento de morte a cada faísca de decrepitude, ou seja, a cada sinal de morte celular em nossa face. E pensamos, “o que fizemos em toda nossa vida?”. Não há como voltar e tentar realizar as grandes piruetas do passado, e assim tentamos com novas piruetas nos tornando “jovens na fala”, “jovens no vestir, imitando o filho ou a filha, sem assenta-se em nossa própria idade... Nos ridicularizando frente à família, a amigos, a filhos... Sem desenvolver um patamar idealístico que combine com nossas maturidade (pelo menos aquela que devíamos buscar).

Mas o espelho está ali e não mente. As faíscas se tornarão tão evidentes que serão necessárias plásticas, a fim de refazer nosso mundo que perdemos quando estávamos dormindo ou quando o trabalho havia se tornado nosso maior inimigo, e assim “tenho que recuperar a antiga forma”...

Os espelhos não mostram o que temos lá dentro de nós. Se fosse possível, mostrar-nos-ia um ser humano confuso, bagunçado, sem rumo... Tão feio quanto a nossa própria aparência. A provável saída, nesse caso, seria um espelho que nos mostrasse o que temos dentro (!). Não o temos...

Em busca do aperfeiçoamento físico, nos esquecemos do interno, aquele que tanto falam os filósofos, que tanto falam as escrituras. Todavia, não temos essa cultura de aperfeiçoamento interno, e provavelmente vamos chorar por muito tempo ao nos olhar no espelho físico. Digo físico porque há aquele que nos induz a nos melhorar como pessoas, nas mínimas coisas que fazemos. São os mestres. Espelhemo-nos nesses grandes homens, cuja sabedoria (apesar de tão antiga quanto qualquer coisa) nos torna jovens em todos os sentidos, pois nos faz encarar uma natureza cíclica, sem a qual não estaríamos a refletir e a viver como homens de bem. A morrer e a viver, e assim sucessivamente, numa eterna evolução.

O espelho interno não se vê, mas pode-nos ser útil no confronto com uma realidade social que faz o possível para desvirtuar valores que nos foram regados no passado, como por exemplo o confronto com a nossa própria vida. E como dizia o mestre Platão “Saber viver é saber morrer”.




Aos Homens de Ouro

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