terça-feira, 27 de setembro de 2011

Papel de Parede (II)

Aí, nos vêm mais questionamentos... Por que temos que passar pelos problemas? Para sermos sábios? Depende, se quisermos ser animais, plantas, pedras, não precisamos de muito esforço... Num curto espaço de tempo, batemos no peito e dá-lhe “eu sou assim mesmo, não tenho como mudar”...! (claro que podemos, somos humanos!). Somos pedras, plantas, animais, e ao mesmo tempo somos espirituais, deuses! É uma questão de decisão...



Com relação aos problemas, vale salientar que podemos não só viver deles como também fazer deles nossos aliados – no nosso caso, para prejudicar ou não a existência individual ou coletiva! Mas também podemos usar nossos problemas como se fossem facas a cortar a melhor das carnes, ou até mesmo ser uma tesoura de jardineiro, a podar as pequenas folhas e pétalas velhas de seu jardim... A sabedoria, ainda que ínfima, nos chega sem despertar.

Na maioria das vezes, no entanto, não usamos nem “A” ou mesmo para “B”, apenas resolvemos. Passamos por cima. Choramos. Gritamos. Sorrimos e não valorizamos a existência como um veículo de crescimento, mas, querendo ou não, crescemos... Pois não há aquele que passe pelo maior dos problemas e vire a cara em sinal de desprezo por alguém que se foi. Aqui, nós sofremos e aprendemos...

Mal Vinda

A morte, como o maior dos problemas, é tão nobre quanto o homem, pois não falha nunca. É disciplinada, organizada, é universal, e em qualquer lugar é respeitada... E temida! Claro, dentro de nossa grandíssima ignorância, ainda que conjecturamos acerca dela, não sabemos o que nos acontece no pós-vida. Nossa educação acerca da morte não existe! É por isso que os antigos tinham menos medo dela. Ela fazia parte do cotidiano. No antigo Egito, por exemplo, havia festas quase todos os dias em homenagem ao sol, à chuva, às plantações, porém nunca deixaram de colocar, ao lado, um caixão como símbolo da perenidade física.

Não há mais reflexões acerca da morte, nem mesmo uma visão coerente quando isso acontece. Isso porque acreditamos que a tradição estava errada quando a ela se referia. Os clássicos tinham mais elementos, mais estudo, mais vivência, e ainda o desrespeitamos com nossas ideias de céus e infernos...! O problema inicia-se aqui.

O que aconteceu conosco em relação aos problemas é que nos desligamos do passado no tocante à solução deles. Não temos mais aquela linha imaginária que nos envolvia à tradição egípcia – berço das resoluções – dos gregos, romanos, etc, os quais, através de mitos nos traduziam uma realidade que buscamos hoje intimamente para a solução de nossos maiores problmeas; e assim ficamos órfãos de pai e mãe, graças a ideias completamente criadas do nada... Ou seja, não temos mais o fio de Ariadne que nos conduz para fora do labirinto.. Muito pelo contrário, lutamos quase que literalmente com o Minotauro rs rs.


Um Pouco dos Mitos


Quando no passado falavam de labirinto, se referiam a nós. E no centro do labirinto, o mistério maior, no entanto, assim como uma grande pedra a ser conquistada, antes de conhecer o mistério total do universo – Deus – os antigos nos faziam lutar com Minotauros, com monstros, além de nos perder em mares, morrer, voltar, enfim, tudo que detestamos e padecemos em nome de algo que queremos conquistar: nós mesmos.

E passando por essa série intempestiva de dificuldades, o herói, assim como nós, se elevava, se transformava em um ser divino. No mito de Hércules, por exemplo, quando o herói mata o leão e se veste com a pele dele transformando-a em um manto, demonstra claramente a vitória do ser humano sobre a personalidade.

No Mito de Teseu, no labirinto, o Minotauro é morto, depois de o grande herói passar pelos caminhos intrigantes com o fio de Ariadne e voltando no mesmo passo depois de vencer o monstro. Aqui, somos nós, de novo, perpassando por dificuldades humanas e nos transformando e rejuvenescendo, matando nossos valores antigos, arcaicos, renovando nossas estruturas internas, matando nossos monstros internos.

Em Troia, quando Ulisses, o grande arquiteto do Cavalo que deu origem ao mito, se revela o maior de todos os homens por ter ultrapassado os portões da indestrutível cidade, se enclausura no mar, por anos a fio, por ter desafiado Poseidon, o deus do Mar, o qual vira no herói um homem que poderia vencer mais desafios antes de chegar a sua cidade natal – Itaca.

E Conseguiu. Ulisses volta, assim como nós, mais humilde e mais sábio. Volta à sua esposa, mata os invasores da cidade, e dela não sai mais. Aqui, somos obrigados a rever nossos conceitos racionais acerca do que somos, pois não somos o que fazemos, por mais belo que seja. Somos algo tão interno, que precisamos buscar entender, a cada passo que damos na vida, o mistério que vive em nós, nem que precisemos lutar o resto da vida pra isso...

No Bagavagita – talvez não seja assim que se escreve rs – temos lutas homéricas (mas não são de Homero!), mas a que mais nos fascina é a de Arjuna. Um ser especial que se depara com todos os seus valores arcaicos – família: irmãos, amigos, parentes, etc – e com eles deve lutar no final. E ao lado de Krishina, o guerreiro chora, pede, reluta e diz que não pode lutar porque todos eles eram seus conhecidos, e que a morte deles seria um fardo a carregar...

Krishina, no entanto, assim como um Avatar ao seu lado, mostra o desígnios do universo, os mistérios da vida, do universo, e na prática revela que a vida vem da vida, não da morte. E que esta não existe, e sim como um rótulo humano para o desconhecido.

Depois de muito explicar, e Arjuna compreender, o guerreiro lança a primeira flecha contra tudo que plantara no passado. Aqui, somos, mais do que nunca, Arjuna e Krishina. O primeiro, a representar nossa personalidade medonha em relação aos problemas; o segundo, o nosso Ser, a parte intocável, duradoura, eterna. Aqui, somos medo, somos dores, somos falhos e ao mesmo tempo louco para saber o que tem depois da vida, ou antes disso, queremos saber o que acontece quando damos o primeiro passo em direção ao nosso maior problema – reconhecer nossos erros. E depois disso, vem-nos a verdade, a simplicidade do sorriso em saber que nada se desfaz, tudo se constrói e nada padece.

Aprendizado

Enfim, se há uma forma de entender nossos problemas, de resolvê-los, de encará-los, de forma que possamos levá-los tais quais pêlos de cachorro, é ter uma meta, e um grande referencial no qual prepondere a nossa vontade – não a vontade humana – e sim aquela que sabe que a Natureza nossa de cada dia tem e terá percalços semelhantes aos dos nossos heróis – e o somos em algum nível – na realidade, em todos os níveis! – sem que achemos que somos os únicos (escolhidos!) a passar por isso ou por aquilo.

Todavia, passar por dificuldades, ainda que seja fácil, ainda nos dá um certo medo (até mesmo os heróis têm medo), pois o que queremos é viver em paz conosco, com nossas famílias, parentes rs rs, amigos – não criar inimigos, seja aqui ou no trabalho; queremos um governo melhor, ou pelo um que governe; queremos como diria aquela música, “queremos uma casa no campo onde possa compor muitos roques rurais, onde passa plantar meus amigos, meus livros e nada mais”.

Contudo, não podemos nos desfalecer como guerreiros que colocam suas armaduras e fingem de morto para que façam nossa parte na guerra. E quando a paz vier, não será a mesma coisa, o sentimento é outro, pois não lutamos. Temos que lutar, armados ou não, ser sinceros, com os pés nos chão, cheios de feridas das outras guerras, e saber que elas nunca cessarão.

Temos que nos alimentar da paz interna, e só assim teremos condições de vencer a todas as guerras, ou antes disso, vencer a nossa guerra, aquela que nos dá medo de levantar e encarar aquele cara sem graça, o chefe mandão, o desemprego; aquele idiota racional que não fala em outra coisa senão em futebol, em rádio, em novela...

E nessa tentativa árdua, hercúlea rs rs, de resolver (ou resolvendo os problemas) ser sempre bom, belo e justo.



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"É ótimo ter dúvidas, mas é muito melhor respondê-las"  A sensação é de que todos te deixaram. Não há mais ninguém ao seu lado....