segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Deficiência: a Guerra Invisível. (I)

Há dias em que não precisamos saber se há infernos ou não. Na verdade, tais dias respondem-me a uma série de questionamentos em situações que me pedem sabedoria – que eu os contarei – os quais vem à vida de uma pessoa que possui visivelmente defeitos físicos, mas não incapacidade de realizar seus sonhos. Acredito que o que lhes vou contar pode servir a muitos...

Fui afetado, na infância, aos cinco anos de idade, por uma doença advinda do sarampo, a encefalite, a qual possui diversos ramos que não sei citá-los. Os médicos conseguiram fazer um estrago em minha estrutura, mesmo a doença tendo cura, porém a incompetência, não. As sequelas foram: peitoral atrofiado, juntamente com braço esquerdo e perna direita, menos quatro centímetro!

Todavia, graças à idade dentro da qual fui limitado, não me afetara emocionalmente (no inicio). Tudo me afetou depois, quando meu racional e emocional estavam bem formados. Também percebi, com o tempo, que não era o único, tampouco o primeiro, a ser contemplado com tal prisão. Mas a história nos mostra claramente a singularidade do tratamento único em relação ao deficiente, em todos os seus níveis, pelos que não são, e às vezes pelos que também são...

Quem é deficiente entende que o mundo já está formatado para uma determinada classe, assim também pensam os negros, os gordos, os magros demais, os pobres, ou seja, os ditos excluídos da sociedade, do mundo... Mas não se pode prosseguir com esse pensamento, aprendi; do contrário, não se anda nem mesmo se trabalha, ou mesmo se vive em função de algo, apenas se esconde ou se enclausura debaixo de véus que ele  próprio – o excluído – cria.

Aprendi a me desfazer desses véus, até mesmo de cavernas! Contudo, de vez em quando me aparecem fantasmas em forma de questionamentos acerca de minhas possibilidades, necessidades e da origem de todo o meu problema, o que não é fácil, não só para mim, mas para qualquer um que tenha problemas físicos.

Assim, desfazendo dessas cavernas, pude entender que o mundo sofre de um grande mal, talvez o maior de todos: o da involução da espécie, a qual não se conhece, ou mesmo se observa no espelho, e quando o faz acredita piamente que não tem problemas, nem mesmo de caráter!

Aprendi a fazer questionamentos acerca do que poderiam refletir, do que poderiam fazer, ou mesmo do que poderiam relevar: o que nos move? O que nos guia? E o que nos faz distinguir o certo do errado? E nossos princípios? O que é alma, personalidade, valores?

  
Tradição.

Sabe-se, no entanto, que, em tempos de guerras, não podemos ser heróis, ou mesmo nos alistar – uma das nossas frustrações! Ao mesmo tempo, podemos ser heróis em nosso nível, levantando, sendo positivos, respeitando as opiniões, e, mais do que nunca, lembrando da máxima de Marcus Aurelius, filosofo, general: “Ao acordar, encontrarás um imbecil, um intolerante, e vai tolerá-lo, mesmo porque ele também faz parte do Todo, e o Todo está em você, portanto ele, o tolo, está em você”.

Ser herói em nosso nível é nascer, se realizar com nossas ferramentas, é atingir o topo de uma pirâmide, seja ela social, familiar, profissional, enfim, é conseguir ser o que queremos ser sem que sejamos discriminados pela aparência, pelas dificuldades, pois somos humanos, e ser humano é ter dificuldades, sejam elas físicas ou não; ser humano é conquistar, resolver, apesar dos pesares e dizer “sou vitorioso!”.

Todavia, a cultura das civilizações antigas, com relação ao deficiente, era... vamos dizer... justa. Não haveria nenhuma possibilidade de o ensinamento de guerra, que era tão forte quanto os de hoje, fazer parte daquele que nascesse com deficiência; e o persa, romano, espartano nesse quesito eram racionais: a morte era certa aos que nasciam com problemas cuja aparência necessitasse até mesmo de auxilio eterno. E os que nascessem com uma deficiência não preocupativa, ajudariam as mulheres na educação das crianças, contando histórias dos heróis passados.

Ou seja, em relação à sociedade de hoje, os critérios eram claros. A de hoje nos preocupa justamente porque não há uma política certa para o deficiente. Então, mesmo que seja cruel, racional, entendemos os critérios que eram baseados em batalhas, as quais não cessavam, e tinham também seus objetivos. Hoje, não há tantas batalhas ou guerras como na antiguidade, porém nos fazem pensar que somos os inimigos do Estado, nos tirando idas e vindas, nossos direitos, e, de alguma forma, sonhos.

A sociedade de hoje, pelo fato de não ter uma filosofia, decresce; e decresce pelo fato de deixar de lado questionamentos do tipo: será que vale à pena criticar alguém que nascera em desvantagem física? Será que só de desvantagem física vive o homem? Será que a estrutura física do homem é tudo para a consecução de seus sonhos, de seus ideais? O que posso fazer em relação a mim e aos meus defeitos internos? A humanidade será melhor ou pior com meus atos?

O que quero dizer? Que sofremos da semântica natural da vida. Aquela que nos faz reais humanos no sentido de compreender a si próprio, e consertar erros internos, os quais são tão problemáticos quanto os externos. Uma prova disso é o suicídio de vários jovens que poderiam ser atletas, soldados, coronéis, professores, mas escolheram o caminho difuso da droga; sem falar nos consultórios de psicólogos, psicoterapeutas, etc, lotados de perfeitos seres estruturados.

A questão é que, quando se tem problemas internos, fica mais fácil retê-los, demonstrando, ás vezes, não tê-los, o que é impossível para um deficiente. Além disso, não se discrimina alguém por ter ser mau caráter, pois fica fácil de fingir tal debilidade. Nós não.

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