quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Submundo


Todos, sem exceção, sabem o que é um submundo. A palavra já nos diz: abaixo do mundo. De alguma forma, passamos por essa via estreita da vida sem que queiramos, mas apenas para saber se somos capazes de suportar a dor e o desespero dentro de nós, tanto quanto uma ferida que dói loucamente após a amputação de uma perna...

E eu sinto isso agora. Meu submundo me fez conhecer o outro lado de uma pessoa a qual vive no real submundo – o da prostituição, da venda de corpos. Talvez, graças a sua educação desvirtuada, ao seu egoísmo infantil, não perceba que nele se encontre, graças a um mundo que nos faz cair em devaneios pelo sucesso a qualquer preço.

Na realidade, a venda de seu corpo já era feita, involuntariamente. Vendia-se aos olhares dos homens, dos adolescentes, acreditando que aquilo era algo talentoso e único. Ela se julgava a única. Nada mais normal. A questão é que ela me encontrou... ou eu a encontrei. Havia charme, beleza, inocência e um pouco de vulgaridade que me fez amá-la tal qual um faraó pelas cheias do Nilo. Eu havia caído nas garras da vulgaridade, e traspassei meus limites: menti, escondi, quebrei regras, fui incoerente com meus princípios, não fui marido, não fui pai... Apenas um homem se arriscando em busca de vida que lhe desse mais ânimo, mais paixão...

É acho que encontrei a palavra: paixão. O submundo ao qual eu me referia fora o da paixão. Esta me levou a conhecer os rios podres da vida; rios que desaguavam em mares de esgotos nos quais lá estavam alguns que eu conhecia, outros passei a conhecer, e outros, a obedecer...

Um mundo sem regras, no qual se faz de tudo para desrespeitar os valores humanos, aqueles que um dia milhares de sábios um dia defenderem, praticaram e que nos deixaram como legado eterno. Ali, naquele mundo, a dor é tão natural, e ao mesmo tempo bestial, que se veem até mesmo familiares caindo no maldito rio...

Os segredos humanos... Eu os vi. De uma monstruosidade! Não sei se comparar a monstros faz sentido. Nós, seres humanos, filhos da eternidade, conseguimos chegar ao fosso sorrindo, sem que nada precise nos empurrar para ele. Os segredos são submissos a outros segredos maiores, ao da personalidade humana, esta infeliz que comanda todos, a levar ao inferno das possibilidades, e nos degrada sem igual.

E eu, filho da resistência, pedia aos deuses que me retirassem desse mal que me assolava, que me possuía. Eu já mergulhava no rio. Mas o desejo de ter aquele ser em meus braços, presa como uma figura quente sem dono, trazia-me a incoerência diária. Noutro dia, no entanto, eu me arrependia quando para o meu filho olhava.

Em mim, o inferno se fazia. Não podia confiar em ninguém, não podia gritar de paixão, dizer que a saudade de tê-la era tanto que a morte era apenas um alivio para mim. A morte... outra palavra da qual eu poderia me sustentar, mas fui forte e pedi aos deuses, todos os dias, que retirassem aquele sentimento fugidio...


Todavia, antes de tirarem-me, davam-se provas a minha personalidade, a qual, sem piscar, era reprovada todos os dias... Mas no fundo, borbulhava o sentimento de fuga daquela vida de degradação pela qual eu passava. No fundo, era só corpo, era só desejo, era só uma fuga de uma outra realidade: a do casamento.

Meu casamento nada mais era que uma problemática psicológica, sustentado em um ato impensado há cinco anos. Ato esse que me tirou o poder de escolher, de viver, de amar e de ser eu mesmo.

Hoje, no submundo, quando eu olho para o alto e vejo minha esposa, vejo um ser que prontificou, ainda que involuntariamente, a me amar do seu jeito: transformando nossas vidas em uma prisão perpétua, cheia de preocupações, medos... Porém, ainda que seja com todos os seus defeitos originados pelo meu ato precípuo, é o céu comparado ao submundo a que me submeti. Lá em cima, eu tento, com minhas ferramentas psicológicas, filosóficas... viver.

No submundo da paixão, não há psicologia, não há filosofia, não há família, não há pudor, apenas a degradação, a vulgaridade em forma de mulher em poses sensuais, se mostrando a um público tão vil quanto o próprio mal.

A vileza não conta. O que conta são as formas sensuais, o sucesso esperado, a vontade de enlouquecer os homens a todo custo, a desesperada via do estrelado pela opinião de vulgares, de canalhas, de estupradores, sem ter medo de virar pó em meio aos valores familiares, divinos, éticos, morais... Nada!

O medo não existe. E sim o vaidosismo ao extremo. Pessoas que posam nuas em revistas o fazem pelo dinheiro, pessoas que querem ser reconhecidas vendendo sua imagem em internet o fazem esperando o sucesso – ou seja, o dinheiro. Pessoas que largam tudo, desrespeitam tudo até mesmo as pessoas que dizem amar, o fazem pelo dinheiro.

O dinheiro, a fama, o sucesso vêm, mais cedo ou mais tarde. Todos eles, um dia, conseguem, pois há de convir que, para se sujeitarem a mentir, a não ter pudor, a não ter caminho, a dizer que amam sem amar, a dizer que têm família, sem ligar pra ela, a falar em educação, sem ligar para o filho / ou filha, e depois colocar o belo corpo à venda... Um dia eles conseguem.

A prostituição não é apenas a venda do corpo em troca de dinheiro. É a necessidade de se mostrar fisicamente, dando margem a qualquer pessoa pensar o que bem entender de um bem que é só seu. Porém, em nome do sucesso (maldito), a pessoa nasce de novo, com valores frios, desumanos, encontrando ali o seu conforto completo.

Eu vi nos olhos do submundo. Lá estavam vários de codinome, que, mais tarde, viraria nome, que mais tarde, abriram mais portas, para aqueles que amavam a si mesmos, não seu próprio corpo.

A porta do submundo não existe. É um buraco no qual, todo santo dia, há pessoas de bem se transformando em mal, graças aos iniciantes, aqueles que trabalharam com afinco a fim de que o buraco seja mais largo ainda... A porta do submundo, como se vê, não é igual a do céu. Nem chega perto. A do céu, pessoas pedem todos os dias para entrar, indo a igrejas, fazendo bons atos; a do submundo está ali, no seu trabalho, na sua casa, pertinho de você, te devorando, pedindo, escravizando, te deixando bem claro que você é dono de si mesmo – que argumento lindo esse, hein! É como um senhor feudal dizendo a um escravo que está livre, mas as correntes nunca deixariam suas pernas; o submundo diz que a liberdade é isso, viver, viver, sem olhar para trás, sem ouvir as pessoas, não ter compromisso; o submundo te elogia na voz dos homens que estão mergulhados no lixo – há famílias inteiras nisso; o submundo é um ser que te diz que o céu, esse que tem aí dentro de ti, não existe, que é coisa de babaca, de gente certinha que morre cedo, e que o que vale é morrer com oitenta e noventa anos, sem amor, sem família, sem alguém que te ame realmente. É tudo que você quer! Kkkkkk!

O submundo esquece, no entanto, que somos humanos, que temos o livre-arbítrio, e que podemos, também, escolher a vida, a real vida, aquela que um dia eu li na Bíblia, aquela que um dia meus pais me passaram, aquela que um dia meus mestres me trouxeram, aquela que, um dia, foi falada por um grande sábio do ocidente... Cristo.

O submundo copia os dizeres dos grandes homens e te faz acreditar nele, tal quais seus melhores professores. Assim, corrompidos pelo mal, estão preparados para viver a grande vida, se submetendo à degradação, à vulgaridade, ao amor barato, mergulhados na dor, que, agora, é apenas é só um detalhe.

Hoje, agora, me sinto como se estivesse saindo – é, ainda não saí – de diversos socos e pontapés. Nesse minuto, me sinto sozinho, mas com esperança de que um dia eu me esqueça do submundo.

E espero que você também saia do seu.

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