terça-feira, 17 de maio de 2011

Cabeças e Precipícios III

Ledo engano. Ainda cansado, deixei inúmeras mensagens em sua secretária, enviei vários sms, pedindo algum retorno, pois não era só uma entrevista, pois também falaríamos com o amigo gerente e, quem sabe, fazer uma boa entrevista... E quem sabe, as portas se abririam.

Fui dar uma volta para relaxar, pois não conseguia falar com ela, de maneira que pudesse ficar menos preocupado... E nada da amiga que “queria” o emprego. E continuei a andar, quando de repente meu celular tocou... Era ela. Com uma voz arrastada, cheia do “to aqui, e daí”, ela me perguntou onde eu estava, e eu disse a ela. Sabendo que estava mais que na hora, ela ainda me disse que estava junto da irmã e preferiria almoçar a fazer a entrevista primeiro.

Eu entendi. Realmente já era tarde, contudo o senso de responsabilidade dela estava no mesmo lugar em que ela tinha deixado o travesseiro. Ela não dera uma desculpa por ter chegado àquela hora. E fui ao seu encontro, no lugar em que iria almoçar, no shopping, com a irmã.

E as encontrei... Levei um susto. Pareciam duas meninas que tinham fugido mãe por não tê-las deixado sair de casa há anos. E mais, de longe, eu as confundiria com duas ripies dos anos setenta, com roupinha à moda. Uma, a irmãzinha dela, com uma bluzinha fechada até a cintura e com um shortinho jeans azul, com as perninhas de fora – tão pequena que, ao subir no banco para se sentar, pensei que pediria auxilio, mas o sapato de salto a deixou uns dois centímetros maior...

O susto maior, no entanto, não levei com a amostra de grátis loira , sua irmã, mas com aquela que seria entrevistada: minha querida amiga, para qual tanto torço e luto para que tenha uma vida melhor, baseada em esforço e dedicações... Minhas, pelo jeito, e não dela: essa amiga tem altura de um metro de sessenta, sua irmã deve ter um e dez...

A suposta candidata à entrevista tinha seu cabelo lindo – até ali. Pois me parecia que tinha saído do banho sem pentear-se, e, como tem o cabelo curto, pegou a parte da frente, que era uma franja, e a levou para cima, até encontrar a parte de trás da cabeça. Seu rosto cheio de ruge parecia-se com de uma atriz da TV Record, a qual adora maquilar seus artistas tapando até a última envergadura do rosto... Não sei para onde ela iria com o rosto daquele jeito!

Com uma blusa branca com estampa, e uma outra de xadrez em cima desta, um colar imenso, destes da moda, reluzentes mais que o sol, davam inicio ao terror, mas o que fechou o filme foi a pequena bermuda jeans que desobedecia todas as normas e padrões de cultura da loja – e talvez de todas as lojas. Realmente não era a pessoa que há uma semana tinha ido comigo a um escritório ser entrevistada.

Ali, naquele momento, havia uma pessoa de mau gosto, sem vontade, sem entusiasmo, sem o caráter de lidar com qualquer pessoa, seja entrevistadora ou criança que passasse no shopping. Ou seja, não estava aberta à conversação. Seu rosto estampava mais: a raiva de mim, por sobrevoar, com meus olhos aquela aparência, no mínimo repudiante. Seus olhos não me olhavam, se chocavam com meus ombros, com meus cabelos, mas não queriam me encarar.

Eu, depois de tudo por que passei, fiquei quase histérico. O ódio me sobrevoava a cabeça como naqueles desenhos animados o fazem quando algum personagem é ilustrado com uma nuvem acima de sua cabeça ao ter um momento explosivo. E eu, grande idiota, ao ver aquela cena, aquele comportamento, senti frio, calor, tremia, e meus ritmos cardíacos, com certeza, subiram mil por cento.

Voltei ao passado em menos de segundos. Ao ver aquela “menina” de trinta anos rebelde sem causa, lembrei-me de meu irmão que tem uma filha, hoje, com a mesma idade e desempregada. Quando esta tinha quinze a dezessete anos, não gostava de encarar o pai. Vestia-se de qualquer maneira, não queria saber de trabalho, e, se fizessem algo por ela, tratava com desdém...

Eu tinha em mãos uma pessoa com a mesma mentalidade ou pior. Esta cara amiga não tinha a idade de dezessete anos. E além de tudo, não queria ser disciplinada, ter a ordem em sua vida e apostava em sua beleza para tudo. Que beleza? Onde ela está quando mais se precisa dela?! Onde está aquela beleza do Orkut, das festas, dos encontros? Se foi.

A beleza externa era tudo que ela tinha para uma entrevista, pois a interna ela nunca tinha, ou tinha e nunca me mostrou. Ali, mais do que nunca, percebi que estava diante de uma pessoa que não queria ser ajudada nem nada. Estava diante de uma pessoa que decidiu traçar seu caminho sozinha sem que alguém tivesse que apontar. Acredito que nem mesmo a placas ela obedece, com receio de que a placa, por pressão, a fizesse seguir um caminho fosse ele correto ou não.

Bem.... Voltando à entrevista.

Peguei, assim mesmo, na marra, dei-lhe uma cópia do currículo que tinha em mãos naquela hora. E ela mal sabia disso. E nem queria saber. Entreguei-lha com um espírito de raiva, de maneira que ela percebeu e, com desdém, o levou para a loja onde vendia roupas masculinas.

Não vale à pena dizer que fiquei à sua espera, conversando com sua irmã, a qual me deu razão em toooda conversa – acerca da vestimenta da imã, do horário, do desdém em relação ao amigo que queria ajudá-la na hora da entrevista, de tudo... Mas depois, numa hora menos odiosa, e por mensagem da candidata, fiquei sabendo que o frasco de loira tinha me achado machista, nervoso e chato... Eu, pela primeira vez desdenhei, tabém.

Ao sair da entrevista, com os pés quase arrastando o chão e com o rosto da maneira como chegou ao shopping, perguntou se tinham falado dela. Não, mas eu disse que da próxima vez ela tivesse a compostura de chegar aos encontros na hora, e que nunca viesse a entrevistas da maneira como ela veio... Resultado: já faz cinco dias que não fala comigo.



(volto, fui tomar água com café!)

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"É ótimo ter dúvidas, mas é muito melhor respondê-las"  A sensação é de que todos te deixaram. Não há mais ninguém ao seu lado....