terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Carnem Levare *




Nosso Carnaval pode ser explicado pela extravagância, irreverência, pela crítica às autoridades, pelo desabafo de um povo que precisa... Desabafar. Em meio a essa alegria, tentamos ser tão felizes quanto os dias em que saímos de casa, pegamos ônibus lotados, trabalhamos feitos escravos mal pagos, a observar a injustiça se plasmar todos os dias em uma tela de quarenta e dois ou sessenta polegadas na primeira vitrine de um shopping.

Choramos por dentro ao saber que nosso dinheiro está sendo desviado -- ou como diria aquele trapalhão, "desviado não, direto para o bolso do infeliz ladrão de pobre" -- e pensamos em como alimentar nossos filhos, mães, mulheres, família, enfim.. A injustiça, como peça principal de um governo fraco, prevalece ainda que lutemos para que suma pelo menos um dia de nossos olhos cansados...

E aparece então o Carnaval, e desaparece de nossas vidas -- em quatro dias de loucuras sem precedentes -- o mal que tanto nos assolou no inicio do ano (taxas, aumentos, impostos, juros, etc) -- como se nos preparasse para o restante do ano... Mas não pensamos assim, apenas como algo positivo, que nos tangencie do presente ou nos engane ao futuro...

É sempre assim, não há outro jeito de nos enganar, a não ser que queiramos dizer que faz parte de um país, que é um fator cultural, necessário, ocidental, etc, etc, além nos fazer crer que pode mudar um país... Não penso assim...

Penso que, se há um meio de nos extravasar, tínhamos que refletir acerca de nossas extravagâncias, pois nelas esconde-se uma essência educacional, querendo ou não, modificando pessoas, sociedades, país... Há mais. Estamos sempre tentando nos policiar em relação ao nossos atos, seja politica, seja religiosamente, e isso nos tem feito retos ou bambos na grande linha imaginária da vida, que, como uma sagrada linha, nos faz sentir dor ou prazer, à medida de nossas ações, e não dorme, não vacila, mesmo porque apenas nós, humanos, dormimos -- metaforicamente ou literalmente.

Mas ainda não entramos na parte filosófica da questão...

A parte histórica do Carnaval fala por si mesma, como parte da filosofia; e como toda filosofia tem um referencial, temos que levar, aqui, em consideração o que representou essa festa no passado tão cheia de alegorias quanto à nossa. 

Antes, os deuses influenciavam a vida das civilizações, mais do que as chuvas, ventos, tempestades, tsunamis, sol... O que não quer dizer que estes estariam fora, mas como próprios deuses em forma de elementos vitais, transformando, com suas grandes mãos simbólicas, o dia a dia do povo.

Deuses

Um deus que era muito respeitado na antiga Gália Aquitânica -- atual sudoeste da França -- o deus Abello, conhecido também como o deus das árvores; visto também como um deus da fauna e flora, as quais eram respeitas naquela passado, tão distante, pelo povo gálio. 

Desse nome, segundo constam, é o mesmo nome de Apolo, deus da música, da Natureza, da apoloraridade, na antiga Grécia. A esse deus eram feitas festas enormes com fantasias nas quais retratavam a figura do grande deus.

Na mitologia romana, tínhamos Ceres, equivalente à deusa Deméter, filha de Saturno e Cibele, amante de Júpiter, irmã de Juno, Vesta, Netuno e Plutão, e mãe de Proserpina com Júpiter.. Essa deusa, a quem eram feitas grandes festas após as colheitas, nas quais o sagrado e o profano quase se igualavam, era a deusa da Agricultura.

A deusa personificava a religação do homem com sua própria parte divina junto à Natureza, e dentro desse âmbito faziam escolas em que sacerdotisas cultuavam e purificavam o nome da deusa. Entre outros deuses que podemos elencar entre tais poderíamos falar de Fauno e Fauna, deuses que estariam ainda responsáveis pela parte mais universal da natureza..

Eram festas ditas como pagãs das quais saiam deuses e deuses louvados pela colheita, pelo fruto, pelas cheias dos rios -- poderíamos citar as festas osirianas quando o Nilo  voltava a se encher -- por tudo que a Natureza dava sem nada pedir em troca. Mas após Cristo, quando a Igreja tomou o lugar dos deuses e impôs o deus cristão, as festas se foram... No entanto, por meio de um acordo feito entre as várias culturas, no qual teria que ser em prol da Igreja, foi decretado que, após o Carnaval, haveria o período da quaresma (quarenta dias sem carne) -- daí a palavra Carnaval, Carnem Levare, significar Sem Carne...

Enfim, mesmo sendo festas pagãs, nas quais havia um sentido sagrado, o nome Carnaval só veio muito depois, como foi dito acima, com o sentido de se abster da carne durante quarenta dias. Mas o que fica é alegria por algo realmente válido, não estrutural mas espiritual, ou seja, por deuses que se manifestavam dentro de nossos meios, como forças misteriosas que nos apareciam quando plantávamos o que era certo à natureza humana.


Hoje... Nosso maior sentido carnavalesco é a alegria, sair do chão, tentar igualar-se ao rico ou fingir-se de pobre, com alegorias cujo simbolismo nos remete apenas a uma história tão fugidia quanto nossa ápoca. Hoje, vamos em bloco exterminar a tristeza, nos esquecendo de que o choro vem noutro dia... Mas, no passado, o simbolismo a que nos remetíamos era em prol de um idealismo universal, no qual o próprio homem não significava muito, mas fazia o seu papel junto à Natureza como parte dela, dentro de um sagrado mistério, que só as escolas iniciaticas poderiam explicar, contudo, o grande povo que fazia a sua festa, a sua parte, sabia que estava colaborando com a grande linha imaginária.



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* Carnaval .

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