terça-feira, 4 de outubro de 2011

A Planta e a Água

Em meio a critérios desordenados de uma sociedade que não sabe o que é ético, moral e humano, penso muito em uma professora a qual me disse um dia que tudo que se faz atualmente, seja para os meios materiais seja para os espirituais, temos que trazer à tona a metáfora da planta e da água. Regar e observar, e quem sabe colher.

É inexorável, dizia. Outra palavra que daria uma dissertação. Mas estamos aqui para nos referir a essa grande simbologia que nos remete ao mundo de hoje, ao que chamamos mistérios reais pelos quais se vive, se ama, digladia-se.

A Planta

Esse dias, meu filho ganhou do colégio um feijãozinho para regar. Estava dentro de um copo de plástico. Além da semente, um pouco de terra. Minha esposa, criteriosa, involuntariamente filosófica, pedia a Pedro, nosso filho, que jogasse água na terrinha. Em poucas horas (digo horas!), começara a nascer uma folhinha (incrível!), e, daí, me lembrei, é claro, do conto de “Joãozinho e o Pé de Feijão”, no qual uma família pobre troca seu último vintém com alguns feijões. O menino – Joãozinho –, que tinha feito o estrago, dormiu dizendo que as sementes eram mágicas, e que iriam ficar muito ricos... E assim, depois de desacreditarem na criança, jogaram-nos (os feijões) no quintal, acreditando que o menino tinha sido muito ingênuo.

No conto, Joãozinho sobe no pé de feijão, que dá direto ao céu; encontra um grande castelo, onde há grandes tesouros, tudo como se fosse um grande universo material, e por ser um castelo, a certeza de haver um grande morador veio lhe perturbar depois do encanto com tantas coisas lindas e gostosas. Ali, deparou-se com a sua falta de comida e que foi alimentada, com a falta de dinheiro, que fora lhe fora suprida com todo o ouro que vira...

Contudo, pela humildade que residia em seu ser, Joãozinho vira uma harpa dourada, cuja beleza era de esquecer todo o resto – com um detalhe, havia nela uma escultura de uma deusa que cantava e tocava-a sem sequer tocar no instrumento. O amor àquela musica foi de imediato.

Sem perceber que o grande morador (o gigante) estava adormecido, tentou levar o máximo de coisas para a sua casa, mas fora impedido. Após sofrer com as investidas do gigante, que de alguma forma queria ter aquele pequeno personagem para si, Joãozinho conseguira fugir, com seu único tesouro, a Harpa-Falante.

Descendo ligeiramente o grande pé de feijão, e com a harpa em seus braços, o menino ainda era perseguido pelo grande morador, o qual não soubera descer – graças ao seu tamanho – a planta, que mais parecia uma grande árvore. Joãozinho conseguira o que queria. E o gigante morreu na queda.

Meras Conjecturas

Remete-me o conto ao pouco que me sobra a refletir acerca de um grande assunto – como regar nossos valores, vê-los crescer e deles usufruir.

No conto, o feijão, ao ser uma planta que cresce rápido, foi usada para estabelecer um tipo de mensagem ao homem, ao mundo, mas qual seria a mensagem?..

É preciso entender que as plantas, pelo menos a maioria delas, sobem verticalmente, assim como tudo que quer alcançar o céu, por isso as árvores eram símbolos espirituais nas grandes civilizações, assim como o fogo, outro elemento forte, cujas chamas nunca declinam em horizontal, mas sempre para cima... Já perceberam?

Dessa forma, o feijão de Joãozinho, no conto, é possível que nos queira transpassar algo desse nível: espiritual. No conto, assim como em muitos, há sempre dificuldades em esclarecer alguns pontos clássicos, que nos faz repensar o que significa subir aos céus, conseguir o grande tesouro, descer, mudar a personalidade, e ser outra pessoa. É quase mitológico.

No conto, o menino conseguiu “subir aos céus”, enfrentar o gigante, descer ao seu mundo e trazer para ele um elemento primordial: a humildade. A harpa era o maior tesouro do castelo, pois adormecia o gigante com suas musicas, e o gigante, em nós, são os grandes problemas que enfrentamos. Assim como Teseu enfrentou o Minotauro no grande labirinto de Dédalo e o matou, a criança, com toda sua simplicidade, o fez de sua maneira.

Assim o somos. Enfrentamos mares revoltos, gigantes, minotauros, potencialidades (até mesmo a TPM feminina! Rs) em nome de uma paz passageira ou mesmo ideal que nos espera para ser um pouquinho mais humano...

E depois de várias tentativas, às vezes vãs, pelos caminhos ditos como estreitos da vida, encontramos nosso tesouro – seja ele em forma material ou não, espiritual ou não – mas que sempre, em cada um – vai refletir como se fosse um céu, um paraíso.

Assim, para aquele que ama a paz, a busca será sob os grilhões! Para o homem voltado à riqueza, o mesmo, mas sempre com certa dificuldade, ou muita. Para os ingênuos, a busca pelo simples-complexo; para o intelectual, a busca pela verdade através do racional.. E para o homem que quer singrar pelos mares em busca dos tesouros mais caros e belos, deve amar o mar, e arte de navegar. Mesmo assim, a busca não será gratuita.

Contudo, como diziam os grandes, nada se faz sem humanidade (a música da harpa)! E isso significa criar meios internos de lidar com os problemas, sejam eles pequenos ou grandes (gigantes), criando referenciais fortes, à medida de experiências individuas, não de terceiros. Ou seja, embora eu possa ter uma ideia daquilo que o outro sofreu, mas nunca terei a realidade do sofrimento em mãos. Porque todos passamos dificuldades, mas apenas poucos sabem o porquê delas, e estes simplesmente vivem sem regras, ou regras que excluem o ensinamento primordial da vida – que são as experiências.

E assim, cada um tem o seu feijão, e o rega, e sobe nele! Mas a tradição (leia-se todo conhecimento deixado pelas grandes civilizações) nos diz que o caminho vertical é próprio dos homens de Bem, daqueles que exercem a espiritualidade, com lastro em valores universais, não individuais ou coletivos, sociais, humanitários, ideológicos... Claro que estes podem ser degraus para o alcance dos primeiros, mas não podemos nos bastar, sendo apenas ideológicos, sociais, coletivos, temos que ser universais nesses quesitos, caso contrário, tudo soará como grãos de feijão perdidos na terra...

Para começar a cultivar, então, essa tal espiritualidade, a que temos direito como homens, regamos, aos poucos, nossa simplicidade, humildade, e ao mesmo tempo fortes em nossos caminhos. O crescimento da planta, nós, vai refletir em nossos atos.


 
Aos Amigos

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