terça-feira, 17 de julho de 2012

O Fogo de Prometeu

Prometeu e o Fogo dos Deuses.


Falar do Fogo de Prometeu requer a subtilidade de um especialista em mitologia, ou mesmo de um simbologista clássico, mas, mesmo assim, minha teimosia em ser um filósofo -- o que não sou, ou na tentativa de resgatar o filósofo interior de cada um, acredito que posso reverberar um pouco acerca deste mito tão belo que fala, mais uma vez, sobre a Consciência Humana.

Vamos partir de uma fonte tradicional da qual muitos retiram vários mitos e os expõem para a compreensão de muitos contextos atuais, nos quais estamos inseridos. Essa fonte se chama Hesíodo, grande poeta grego, que iniciou sua jornada na mesma época em que o historiador Homero iniciou sua empreitada em visitas a várias civilizações, das quais retirou as mais belas histórias. Hesíodo, assim como seu contemporâneo, escrevia peças, poesias e escreveu a saga de Prometeu por volta do fim do século VIII a. C.

O Mito


Segundo nos conta o poeta grego, Prometeu, irmão dos deuses Epimeteu, Menoécio e Atlas, filhos de Jápeto e Clímene, teria tido a tarefa de criar os homens e todos os seres da terra. Seu irmão Epimeteu encarregou-se de dar dons variados aos animais, como força, coragem, rapidez, além de asas e outros recursos para a sobrevivência... E o fez. Porém, ao chegar a vez do homem, formou-o do barro; e não havendo mais recursos para dar vida ao homem, recorreu a seu irmão Prometeu, o qual, já conhecido por desafiar a Zeus e sua Onipotência, roubou-lhe o Fogo.

Por sua vez, o deus dos deuses castigou o deus rebelde, crucificando-o (algumas das vezes, colocam em traduções diferentes, dando margem a outras interpretações, como em uma que diz que Prometeu foi colocado junto a rochas no Cáucaso, acorrentado, e devorado diariamente pelo fígado por uma águia – na maioria das vezes, um corvo, símbolo maior dos mistérios, da dúvida, da queda...), por mais de trinta mil anos -- Hércules, mais tarde, o salva, libertando-o...

Significado base.

Já explanamos acerca de vários elementos e seus significados, aqui no blog, o que nos facilita entender a natureza de vários daqueles que sintetizam, de pronto, um que pode estar por trás do que dizemos; nesse caso, ao citar o mito de Prometeu, teremos que falar essencialmente de duas coisas que clamam para serem dissertadas – a Matéria e o Espírito, os quais, por natureza, já constam nas mitologias gregas por terem valor universal.

Prometeu
 
Prometeu representa “a dação do fogo divino à humanidade”, ou seja, ele é “o símbolo da Alma humana”, o qual sente a necessidade subir, elevar-se, encontrar-se com a sua origem – com Deus. Contudo, está acorrentado à matéria, graças aos desejos que sintetizam o ouro de plástico, que engana e trai, além de retardar o crescimento do homem.

Desejos estes representados, na maioria das vezes, pela paixão ao efêmero, até mesmo pelos instintos, os quais podem ser responsáveis pela involução da espécie humana e também da evolução. Aqui a matéria tamém se faz responsável pelo retardamento da alma humana à origem, pois brilha e reluz falsamente tal qual, como diria Platão, um sol falso dentro de uma caverna.

A Faca

Um dia, um professor nos disse “A faca pode cortar a carne do boi, mas pode também matar semelhantes”. Assim usamos nossa capacidade de progredir (e discernir) espiritualmente, como se fôssemos assassinos em busca do ouro perdido, passando por cima de nossas reais naturezas, ou seja, sermos mais humanos, ou mesmo um pouco divinos, em nossos atos, em nossas capacidades de sermos um pouco melhores a cada dia.

Não fora uma faca, mas uma chispa divina nos dada pelos deuses, os quais são a soma de nossos desejos, ou do que realmente somos, que é usada de maneira errônea desde que o homem é homem, contudo, há aqueles que entendem e sabem que a praticidade espiritual leva (e eleva) o ser humano a conquistar seu tesouro maior, que é a sua própria identidade: "Somos deuses e nos esquecemos disso", disse Platão.

Mas graças a valores falsos, os quais nos confundem todos os dias, em forma de partidos, religiões, até mesmo em conceito de família, somos obrigados a buscar mais profundamente a tradição, ou seja, entender que existiram no passado homens que se projetaram em nome do conhecimento maior, de uma filosofia que abrangesse o universo e sua semântica natural, isto é, a de que somos parte dele, porém, hoje, enraigados de matéria, não sabemos conduzir esse conhecimento, pois, além da matéria, nossa razão está submetida -- graças a Idade Média eterna -- a refletir a terra, os valores passageiros, as sombras, o efêmero.

A Matéria

Tais valores existem como forma de barreiras que impedem a ascensão da alma humana, que quer voltar a fazer parte do Olimpo interior; assim, mitos, como Psiquê, Dedálo e Ícaro, e outros, sintetizam o que podemos chamar de realidade do Ser. A matéria não se refere apenas ao concreto, mas a sentimentos que prendem a alma com laços firmes, valendo-se o homem de aventuras idealistas na tentativa de desfazê-los no limiar de sua jornada humana.
E assim, a chipa divina de Prometeu se esvai em cada ato hediondo, abrindo feridas em nome da corrupção, na transgressão de nossos valores morais e éticos, os quais são pontes (às vezes, caminhos inatos), torres, montanhas, sem falar mastros nos quais bandeiras flamulam em nome de um ser que nos espera lá no topo.

Espírito


O topo a que me referido é apenas uma metáfora do que podemos alcançar. O mastro sería nossos caminhos os quais poderiam ser retos, sem aquela curva karmica. Porém, o que realmente nos faz dentro da razão, a que espelha o real sentimento de ascenção da alma, é a experiência, a labuta, a dor, e depois de tudo, a escolha pelo divino (sagrado), tudo dentro das possibilidades de cada um.

E dentro dessa realtividade de experiências, tentamos subir, viver um pouco do que muito um dia vivemos remanescentemente. Aqui, a alma começa a roça o espírito, e sente na obrigação de unir-se a ele em forma de ações, comportamentos, dedicação ao próximo etc, acreditando que o espírito se sente bem com o advir da alma...

Mal sabemos, no entanto, que o espírito não pede, não reclama, não divaga, Ele simplesmente existe assim como uma estrela que subjaz às nossas possibilidades, por isso cantamos, e até fazemos reverberação acerca do que somos e podemos ser, mas apenas os grandes filósofos, que se iniciaram na matéria oculta, souberam lidar com o mistério que o ser demonstra.

Platão, por exemplo, alude acerca do Espírito, mas de maneira racional e ao passo mítica, ou seja, de uma profundidade tão ampla que até mesmo os especialistas no filósofo se confundem.

Quando o mestre fala sobre Nows, por exemplo, ele sintetiza o Deus no homem, mas ao mesmo tempo, há um Nows além-homem, o qual traspassa a compreensão humana, pois ele não se refere a qualquer deus pessoal antropomórfico, ao citar este último Nows.

Hoje, fica um tanto quanto explicitar sobre o que chamamos de espírito, pois confundimos com uma sombra humana que está para-além do cosmos e ao mesmo tempo ao nosso lado, representado pelos seus arcanjos.

Nada, no entanto, nos mitos Greco-romanos ou egípcios há dessa forma que não seja uma simbologia perfeita da origem do universo. Quando há figuras antropomórficas, há a certeza de que estamos falando de algo que possa ser maior que a nossa compreensão em forma de valores além-humanos. Mas que, assim como qualquer mito, nos faz buscar, por meio de empreitadas, a realização ou mesmo a sabedoria divina, sendo um pouco, todos os dias se praticado com disciplina e ordem.

De volta a Prometeu.

O Fogo, além de significar os desejos humanos, pode sintetizar a chama eterna que arde dentro de cada um, ou melhor o próprio espírito, como assim o diziam os greco-romanos em épocas passadas quando, em praças públicas, tinham uma labareda que ardia em nome dos deuses, e que tal Fogo era mais que isso, seria a representação do mistério que arde flamejante em nossos vistas sem que saibamos o porquê e para quê.
E com uma réplica em cada casa, os romanos se davam por completo para que tal chama jamais se apagasse, sempre se curvando, e respeitando aquele pouco que ardia no cantinho da casa, em nome de Deus.

A chama de Prometeu é a Vida. Esse ser incompreensível aos olhos dos ateus e cientistas, os quais acreditam que tudo é por acaso, e que por isso, como dia uma grande professora, “não choram em enterros”.

A Vida foi resgatada por Prometeu e cabe a nós fazer jus ao que ela representa, ou mesmo ao que ela nos dá de presente todos os dias – um sol maravilhoso, cascatas em forma de véus de noiva, lírios, pássaros, belezas que nunca, jamais, serão vistas como nós, humanos, a vimos.




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