quarta-feira, 24 de outubro de 2018

A Mesa, o Forro e o Jarro

Um dia um mestre de filosofia eloquente*, perspicaz em suas belas colocações,  a prescrutar os olhos de seus convidados, e com ele o microfone enorme de uma década que me parecia mais a da Segunda Grande Guerra, nos disse em uma de suas palestras maravilhosas, em Buenos Aires, Argentina... "Mais do que nunca temos que observar que estamos nos distanciando pelas diferenças, mesmo sabendo que não existe uma partícula universal uma igual a outra. Nos detalhes de cada espaço, de cada princípio, há a diferença que embeleza, que une, refletindo o belo necessário ao homem".

Falava o grande general da palavra, que, em sua humildade não cristã, salientava em poucos segundos o que éramos e não éramos, o que refletia uma época e o que nos fazia separar do que necessitávamos para prosseguir como humanos. É certo que soava como cristal em nossos ouvidos, e mais certo ainda era a certeza de que ele não estava errado em suas colocações por mais que buscássemos nas entrelinhas semânticas que criava, como mágica, iluminando nossas almas.

Prosseguia... "Se temos uma mesa, forrada com um pequeno pano, e em cima dela um pequeno jarro que a ornamenta, podemos dizer que há três elementos que edificam nossa mente, pois não transgridem realidade alguma, mas edifica, embeleza, harmoniza, e posso dizer que criou-se algo que religou-se com o universo, pois se reuniram forças que equilibraram uma parte dele"...

Vi que o universo ao qual se referia não era o meu universo, nem mesmo o de todos ali, mas a junção de todos os universos que se equilibram com fins puros e desinteressados, mesmo porque não havia alguma inteligência que espreitasse ou tentasse estabelecer critérios dentro do detalhe exemplificado ou fora dele. Quero dizer que, desde que nos direcionamos a algo, com fins de equilíbrio, caímos em esferas humanas, as quais sintetizam o que a própria razão -- as vezes maculada -- se direciona e nos faz acreditar que estamos corretos.

Quando o grande e sagrado filósofo expôs seu ponto de vista quanto ao equilíbrio de forças, estaria, claro, em sua razão elevada, voltada aos princípios sagrados, assim com um faraó em suas petições aos deuses, com fins de melhorias ao seu povo; estava além. Costumeiro a ser impiedoso, no melhor sentido da palavra, o mestre sintetiza ali o que realmente precisamos, "urgente!", como ele mesmo sempre dizia, de reunir as diferenças com fins de embelezar o universo, a vida, em meio a um caos que formamos há séculos.

Mas não é fácil. 
Somos dotados de uma máscara impiedosa que nos fecha os olhos e nos abre brechas traseiras, sempre a observar a parte traseira de nossos passos e não o futuro, o que nos dificulta em realizações e até mesmo em compreender o que mestres, não apenas esse, nos passam com suas chaves, com seus brios e palavras, e certezas que, sem certeza, não as ouvimos.

de Volta

A mesa ainda estava lá, como princípio; o jarro embaixo do pano, e nossos olhos, arregalados, não sabiam o que dizer, nem mesmo fecharem-se, pois tínhamos medo de perder a beleza das explicações acerca de um mundo melhor, com homens integrados, harmonizados apesar das diferenças; medo de sair dali e não mais ouvir aquela voz contundente, forte, firme, soando tal qual uma sinfonia de Wagner em meio às batalhas.

O medo se foi, e vimos que era possível. A mesa e seus elementos que a compunham na concretização da beleza demonstravam não apenas nossos corpos sujos pela moda incoerente e sua falta de respeito à natureza, mas principalmente o universo humano em que residimos, presidimos e mal sabemos com ele lidar pela falta de "tempo"... 

Mal sabemos que o tempo não nos falta, mas nos sobra, até mesmo nos ensina, pois quando se envelhece, quando se percebe que a pressa é a nossa maior inimiga, já é tarde -- por isso, o medo. Não precisamos ter medo, mas sim, olhar atentos ao que está por trás de cada elemento vivo, saber o que nos trás, o que há em sua sombra... Não é difícil, mas urge buscarmos a beleza no equilíbrio, nas forças antagônicas, sejam elas com fins internos ou externos, porque se decaímos em modas que dizem que organização, ordem e equilíbrio nada mais são que coisas arcaicas, que o que vale é ser feliz... desconfie.














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*Jorge A. Livrarga

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