Voltando ao Filme.
Esse capítulo é em homenagem ao meu filho. |
...Noutro dia, quando Kevin tinha sido deixado pela mãe na
escola, vira movimentações na rua de Nova Iorque, e sabia que nada daquilo
tinha um sentido normal ao ver dele. E quando olhara pelo retrovisor da van, do
banco do passageiro, percebera – assim como todo grande cavalheiro o faz ante
um inimigo – correrias em direção a um tampão de esgoto, que serviria de
depósito de roubo para marginais.
E naquele instante, como de câmara lenta, seus sentidos o
direcionarma a um grupo conhecido dele, o mesmo que o queria morto no parque,
jogando uma bolsa roubada de uma senhora, dentro do esgoto, levantando a tampa
pesada...
Para Kevin, Don Quixote, como um herói disfarçado, era
melhor esperar a noite cair para ir atrás daquele objeto, o qual seria tão de
valor quanto um tesouro perdido. Para
Kevin, era o momento de virar herói, com todas as suas dificuldades, as quais
não eram nem de longe percebidas, em razão de sua natureza determinada, mas
antes de tudo acordar seu grande (literalmente) amigo Maxx.
“Um cavalheiro não tema a morte”
Ao bater nas janelas de seu vizinho Max, Kevin já estava com
seu manto de cavalheiro, a procurar o tesouro de “rainha da Patagônia”, como
ele mesmo inventou – ou não! – mas antes tinha que fazer com que seu Sancho tivesse o mesmo ânimo, a mesma
determinação. E depois de palavras raivosas vindas do grandão, Kevin, o
falador, com sua cabeça dentro do quarto e seu corpo, fora, olhou nos olhos de
Max e disse... “Um cavalheiro não teme a morte”.
E se rendendo ao fator ideal, os dois, fantasiados de
qualquer coisa que não pudessem ser identificados na noite, foram ao local onde
jogaram a bolsa. Com táticas físicas (matematicamente, falando), Kevin levantou
a tampa, a fazer com que seu amigo, mais uma vez, reclamando, descesse e
fizesse as honras de encontrar a bolsa da “rainha”.
No entanto, naquela mesma noite, a gangue iria buscar o que
lhe era de “direito”, e com mais ou mesmo dez meninos, maiores e saudáveis que
os dois heróis, apareceram e já queriam saber o que os dois estavam fazendo
justamente no lugar em que tinham jogado o tesouro.
“Um Cavalheiro faz o que é correto e justo”
E como sempre, a gangue, liderada por um falador de
inteligência média, foi alvo de desdém do nosso querido Kevin, que, mais uma
vez, apesar de seu aspecto físico que não lhe dava vantagem em nada, e era o
que contava naquele instante, provou, em nome não apenas da coragem a que
devemos lidar diariamente em nossos percalços, mas igualou-se aos grandes
cavalheiros arturianos, os quais não fugiam de ninguém, muito mesmo de suas responsabilidades.
Maxx, com pavor, implorava a seu amigo falador que
devolvesse a bolsa, senão teriam que sofrer consequências greves de marginais
frios, que estavam ali com apenas um compromisso, o de recuperar o objeto de
roubo, e, se reagissem, algo de ruim poderia acontecer.
Contudo... Kevin, encarnado cavalheiro inveterado, não tinha
papas na língua, nem mesmo em seus atos. Com o pouco que tinha, em cima dos
ombros de seu amigo – que o havia colocado quando os marginais chegaram – puxou
umas das escadas de acesso a um condomínio, dessas que ficam do lado de fora,
subiu nela, ficou em cima de uma grade e fez até mesmo seu amigo se
impressionar, dizendo... “Não posso devolver o tesouro da rainha da Patagônia!
Um cavalheiro sempre faz o que é correto e justo!”... E subia mais...
Porém, o líder da gangue, cansado de ouvir o corcunda, como
ele o chamou, retirou de seu bolso uma corrente imensa, começou a rodá-la
frente ao grandão, que ficara pasmo com o instrumento. Naquela situação,
todavia, como num passado longínquo, em que sempre nascem os medrosos, ou os
maiores guerreiros da história, Max se viu preso entre dois mundos... O real,
em que poderiam se machucar e perder uma luta desigual, e o imaginário, no qual
poderia reagir e dar dúvidas ao destino.
Aqui nascera mais um escudeiro de valor... Marx, que
possesso, ou mesmo louco pela circunstância, pegou o tampão do esgoto, rodou
ferozmente em direção aos marginais, a gritar temerosamente como um lobo
furioso, de cara, acertou a corrente do líder, e para terminar quebrou um taco
de beisebol, que, naquele instante, já se ia em direção à sua cabeça!
Ainda gritando, jogou a tampa no meio da horda, dos homens
maus, dos Kurus*!, que, amedrontados, saiam como hienas loucas com o rabo entre
as pernas. Para Kevin, que tinha observado a cena, seu amigo Maxx tinha
encarnado um outro cavalheiro, levantando seu escudo, quebrando espadas inimigas,
e eternizando, mais uma vez, um momento entre os dois – amigos e seguidores do cavalheirismo
épico.
Eles, agora, tinham que devolver o tesouro à rainha da Patagônia...
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