terça-feira, 3 de abril de 2012

A Música e Eu (ii)

Bossa Nova: forte influência do Jazz.


Às vezes parecia que de tanto acreditar em tudo que achávamos tão certo,
teríamos o mundo inteiro e até um pouco mais, faríamos florestas no deserto” Andréa Doria / (Legião Urbana)



... E embalado pelo idealismo de muitas bandas, e hipnotizado pelos discos que se arranhavam nas agulhas, deixei que minhas veias e a música se tornarem uma só. Eu e a música éramos um. Não havia outro jeito. No banheiro, no quarto, no trabalho, na escola... Eu tinha algo em mim que queria gritar, por pra fora, mas não conseguia. A música, no entanto, fizera o trabalho por mim.

Lembro-me de quando minha mãe dizia... “até quando isso?!”,  e eu não sabia o que dizer. Apenas ouvia, ouvia, ouvia... Atordoando os mortais do meu lado. Eu não. Eu e a música éramos eternos. Até mesmo em enterros, quando sentia que estava ficando muito triste, lembrava de canções que possuíam batidas fortes e dali pra frente pés e corpo começavam a se mexer, discretamente. Eu era louco.

Loucura, graças aos deuses, tem idade e não eternidade. Os anos foram se passando e com eles minha maneira de ver o mundo. Principalmente depois que me engajei no serviço público. Mesmo assim, me lembro quando houve uma reunião dos candidatos que foram chamados para trabalhar, aqui, no Tribunal.

Era de rir. Queriam fazer algo no qual os pretensos indivíduos manipulados pelo cafezinho falassem de sua vida, de que mais gostavam, quais musicas ouviam... E foi ai que o vexame se fez. Eu, que há época tinha saído da adolescência, com meus vinte e poucos anos, ainda apaixonado pela música negra, me submeti a um daqueles momentos impagáveis.

Meus colegas adoravam MPB, Jazz, Blues, Clássicos diversos, e eu... Rap, a ovelha negra das músicas. Muitos riram, outros respeitavam, mas o que me ficou na esfera lúdica da coisa foi o riso patético daqueles filhos da burguesia que nem sequer sabiam a graça que tem em ser o que somos, independente do lugar em que nos encontramos.

Sei que há fases e fases, mas eu ainda defendia as minhas antigas, nas (e pelas) quais passei bons momentos, e não abriria mão jamais disso. Resultado, ainda que houvesse marmanjos cultos na sala dos novatos, se fazendo de maiores, eu me sobressai. A música tem disso.

Um Banquinho e um Violão...

Como eu disse, todavia, crescemos. Submetemo-nos a momentos que nós mesmos criamos, graças à lei da ação e reação (calma), estou me referindo a situações nas quais nos pegamos sem calças, cuecas... E pude perceber que, ainda que gostasse do que gostava, teria que sair dessa fase barulhenta e sem rumo da minha vida, mesmo que ainda batesse o pezinho embaixo da cadeira.

Dali em diante, comecei a estudar e não havia mais ninguém que pudesse me dizer o que eu era, o que eu pretendia, o que eu queria, apenas eu. A música de minha vida agora era a bossa nova. Um ritmo quase que sampleado do jazz que invadiu minha vida ao assistir, em pleno teatro nacional, Leila Pinheiro... Aí já é covardia! Eu vi meu idealismo contundente se derreter naquela voz, naquela suavidade em forma de pessoa – e morri, e voltei. Minha iniciação musical se fez.

E a cada passo que dava em direção aos meus estudos, a bossa nova – como nos anos sessenta – subia as escadas comigo, sorrindo, feliz, suavemente... E comprava, escutava, e, ao contrário (totalmente) das batidas americanas, minha alma estava se tornando algo mais pomposo, mais fácil de se carregar.

Ao som do mestre Tom Jobim, e do grandíssimo João Gilberto, meu chuveiro caia em gotas leves em uma cabeça que, agora, só pensava em terminar os estudos, fazer alguma especialidade, e fiz.

Mas quem escuta os mestres da Bossa, deve passar por obrigação pelos grandes da MPB – Gil, Caetano, Chico Buarque, Milton, entre outros. Eu me enamorei de todas as canções belas de uma língua que há muito eu havia deixado graças ao estrangeirismo da juventude. O idealismo, no entanto, foi encontrado em músicas da década de setenta, com Chico, Caetano, os quais alimentavam meu ego racional e ao mesmo tempo emotivo. São páginas que não se passam na vida de um homem.

Jazz: o primeiro degrau do bom senso.


O Jazz e Blues


O Jazz, natural de Nova Orleans, nos Estados Unidos, influenciou deveras gerações, principalmente as do século vinte. Unido ao balanço do negro pobre à subtilidade do homem branco rico, o ritmo cresceu, sem nem mesmo passar pela adolescência. Com um contrabaixo, pratos de metal, um sax ou trompete, as casas de jazz americanas lotavam para traduzir a elegância do negro americano. E, a partir dali, do ambiente saudável, cheio de musicalidade, e estilo, senti a ousadia de tentar ser eu mesmo, no melhor sentido da palavra.

Um ser com um estilo próprio. Eu passei a amar o Jazz; ouvia todos, até os mais anormais. O jazz mostrou-me que a música tinha cor; não a musica Pitágorica, a Clássica, mas aquela que produzimos baseadas em nossa cultura, em nossa personalidade, de acordo com nosso caráter – e, claro, tudo isso já se passava em minha cabeça desde o Rap, mas ficou mais claro agora, num momento em que meu espaço havia crescido e se tornado mais que cultural. Eu havia chegado a mim mesmo...


Um comentário:

  1. RegisBama,

    "sem música a vida seria um erro", já dizia Nieztche. Concordo 100% com ele e com você! Obrigado por dividir comigo as manhãs musicais aqui nesse sarcófago... (Será que os faraós também gostavam de música??):)

    Abraços fraternos,

    Lulupisces.

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A Parte que nos Falta

"É ótimo ter dúvidas, mas é muito melhor respondê-las"  A sensação é de que todos te deixaram. Não há mais ninguém ao seu lado....