Ao vir algo se destruindo ou mesmo em falta porque acabou, temos a impressão – uma ligeira impressão – de que podemos repor rapidamente. Sim, dependendo do que estamos nos referimos, sim. Mas até mesmo esse algo, mais tarde, pode vir a se acabar... Ou seja, das mínimas coisas às maiores – isto é, de um cartucho que podemos trocar ou mesmo um sol que nos ilumina – tudo pode se esvair como água que se vai na ladeira ou grãos de areia no vento forte. Nada fica para contar a história.
O homem também é assim, possuindo seu físico forte e às vezes fraco, tem um físico concreto, biológico minuciosamente perfeito, mas que, de acordo com a natureza do concreto, do palpável, deve partir, virar areia nas mãos da natureza. Soprado pelos ventos divinos.
O estranhamento, no entanto, não é o medo de ver seu físico partir, mas a dúvida para onde ir depois que se deita na cama eterna, por isso a identificação com o físico. Sócrates um dia disse, antes de tomar seu veneno, que “o homem, por não saber para onde vai, é que devia ter menos medo”.
Hoje, no entanto, sobrevoa, em nós, as esferas duplas do céu e do inferno – como já fora explanado em textos deste que lhes fala – por isso o medo. Esse antagonismo célere desde o dia em que nascemos até o dia de nossa ida ao desconhecido nos fez menos buscadores, menos guerreiros, e ao mesmo tempo mais compassivos, menos aguerridos, enfim, toda a cultura relacionada a essa duplicidade nos fez mais lentos, menos descobridores e menos filósofos.
“Sombra e Pó”
Sabiam os guerreiros gregos e romanos que o físico tinha uma finalidade, a de realizar justiças na terra, sempre dentro de sua natureza, dentro de sua capacidade, ao contrário do homem de hoje, que, se algumas vezes se arrisca é muito mais para bater um recorde ou por uma medalha, o que vai de encontro a outras culturas das quais se tirava, nas guerras, lições de dação, de heroísmo, e ao mesmo tempo de consciência em relação ao seu corpo.
Diziam antes da batalha “É apenas sombras e pó”, entregando-se ao meio para salvar suas terras, sua família, seu amigo ou mesmo o seu exército. A cultura “sombra e pó” não era apenas uma expressão, e sim um legado. Todos os guerreiros tinham, desde a mais tenra idade, desde o dia em que seus pais o faziam confrontar-se com touros ou leões, a sabedoria interna. Hoje, desde criança, fugimos de testes naturais, até mesmo em uma simples caminhada ao sol. Isso revela um ponto crucial: que estamos mais acomodados em relação ao que somos, ou mesmo enganados.
Isso se deve, talvez, a grande maioria de comerciais, propagandas massivas, revelando o que temos ou não que fazer com nossos corpos. E isso nos dá outro tipo de medo: o de que temos que ser iguais àquele que conseguiu ser melhor do que nós em físico – não em espiritualidade, como antes.
O guerreiro romano, como já se estudou, tinha a estatura de um homem médio – um metro e sessenta mais ou menos – e não era muito forte, contudo, tinha a aparência de um dragão pronto para mostrar suas chamas. Os inimigos sabiam que era assim, mas o medo do inimigo era ver a luta, a disposição daquele homem que crescia dentro da batalha tal quais os gigantes ciclopes de um olho só; mas ali, eram guerreiros com seus mantos vermelhos, cor de marte, deus da guerra, com seus elmos, escudos, espadas, ceifando vidas alheias como um assassino em potencial, mas não eram.
O guerreiro romano (e o persa, o espartano, grego...) era tão espiritual quanto o homem de hoje, que, embora clama um Deus santo, um Jesus dos humildes, corta cabeças de muitos e empobrece a todos, além de desfazer gerações de indivíduos os quais poderiam batalhar sem medo. O romano que ia à batalha estava ali por um ideal, que era transformar Roma em um celeiro de homens fortes, espirituais, conscientes, divinos, e quase conseguiram...
Hoje, ao viver do físico, temos a ligeira impressão de somos perseguidos por ladrões, por assaltantes, por sombras que desconhecemos além da nossa, enfim, pela incapacidade de lidar concretamente com o conhecimento que um dia nos fez fortes e heróis, nos alojamos em nossas gaiolas (casas) e assistimos aos heróis nos filmes, às vezes, em sonhos, e acreditamos que a vida é maravilhosa porque não precisamos guerrear com antigamente.
...Falha nossa.
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