terça-feira, 27 de março de 2018

Oceanos Ocultos

Continuando com nossas reflexões acerca de nossa existência, agora no nível mais simples, percebo que pensar sobre o Nada é também pensar sobre o tudo. Não existe o Nada na concepção grega de ser, mesmo porque quando olhamos o céu, por exemplo, o nada pode ser relativo, e isso nos faz, mais uma vez, ser dono da razão -- o que não somos. Quando estrelas pairam lá em cima, dentro de um pano negro chamado espaço, quando uma pequena lua brilha frente ao nossos olhos, tudo bem, podemos dizer que há algo, mas quando buscamos mais elementos, mais formas, mais pontos equidistantes entre nós e nossos questionamentos, não encontramos... É a razão em sua tentativa de encontrar algo que a satisfaça. 

Se fôssemos astronautas, diríamos que o universo é cheio de  matéria, composto por ela; os planetas, os astros distantes, os cometas, as formas nunca vistas, enfim, nos satisfariam os olhos ainda que cegos. O Nada em sua forma mais exata estaria ali do nosso lado, em nossa frente, dentro e fora de nós. Entretanto quem se lança ao Nada e o percebe também sabe que nele há o Tudo, composto de uma máscara imensa tão maior que o Nada, que, oculto, tenta se esconder e não pode. 

Nesse mundo, entre o Nada e o Tudo, estamos com o pouco dos dois, prestes a entender o que há na fronteira entre eles. E quando encontramos essa fissura, esse cinto no meio deles, esbarramos em outro, o nosso, que fica entre a personalidade -- o Nada, e o Espírito, o Tudo. A relação destes é a mesma que a mão e a luva, o copo e água, a vela e chama, que nela fica até o fim. Nada diferente do que percebemos entre o corpo e a alma.

A única percepção que nos enriquece, porém, é do Tudo, que nos assombra com sua grandeza oceânica inatingível, a qual podemos ter em mãos, observar, tatear como crianças que nasceram com as mãos grudadas nas da mãe... Enlouquecemos e por ela fazemos de tudo. Nesse entusiasmo, contudo, somos ainda meros sonhadores que percebem que, nas entrelinhas, há algo que segura o Tudo, como uma grande pilastra mágica e invisível, e nos deixa, aos poucos, mais impressionados e assim nos tornamos buscadores daquele ser que está por trás de (e do) Tudo, impressionados como faróis imensos -- assim nós somos. 

A realidade desses dois seres é essencial em todo campo, seja científico, seja religioso, e quando se deparam harmonicamente, sem rótulos, diante deles, entende-se que a parte que nos cabe é compreender o que está em nós como tudo, como nada, andar lentamente em nome de uma organização que se mostra ou não, sentir cada estrela oculta como se fossem poesias em nós; olhar ao sol, clamar um pouco dele em si, praticar sua Justiça natural, esquecer-se de nossas relativas posições e trazer à tona o que percebemos como Nada e viver intensamente cada mistério nesse Tudo maravilhoso.


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