quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Sonhos que Vivi.

Penso em colocar para vocês, e espero não enche-lhes a paciência, um pouco de minha infância, adolescência, de seus momentos puros, ingênuos até, como se fosse um pequeno diário a alguém que preza ainda as artimanhas sem maldades. 


Não tenho vergonha de minhas origens. E você?

Primeiro amor

Em pequeno, na primeira série, me apaixonei. Uma menina linda como uma sereia sorridente, que ondulava seu corpo naquele andado tão quente e singelo, que nunca irei esquecer mais na minha vida... Depois dela, outras e outras, como pragas em minha alma; mas o que mais me impressiona nisso tudo é que eu, ainda que sofresse, gostava e me alimentava e corria atrás desse sofrimento gostoso... Para muitos não.

O Banheiro

Lembro-me ainda de minhas peripécias em tentar ver meninas nuas a entrar no banheiro, e já que o danado era de madeira, longe das possibilidades de segurança, corria para trás dele, ficava atento às falas, aos comentários, e sorria bem baixinho, como um rato que sabia onde estava o queijo e sabia como pegá-lo... Era mais que isso. E queria vê-las nuas.

Meus olhos, mãos, corpo em geral, em um só ritmo, tremiam de medo, apesar do sorriso. É claro que alguns amigos já sabiam, mas não a maioria; o que me fazia, depois do atentado, um santo que só estava passando e de repente... Foi obrigado a usar a parte traseira de um banheiro lotado de mulheres!

Sim... Havia sempre enxames de mulheres. Vizinhas ou não. Todas elas usavam aquele “biongo” no fim do quintal para tomar banho. E eu, inocentemente, dono de uma travessura pura, estava sempre lá...

Primeiro Beijo

Mais tarde, em meu primeiro beijo – como um vento que colidira com outro – achei, enfim, que Deus existia. Sentia-me os últimos dos homens, mas nem tanto claro, pois, por onde eu passava, fosse ao lado de minha mão, ou mesmo ao lado de minhas irmãs, sentia que estava sendo observado daquela maneira, quando meninas cochicham no ouvido da outra, davam-me um tiauzinho, junto com sorrisinho, e... Pronto.

Que bobagem; penso; depois de tanto tempo, de tanto por que passei, ainda me importava com aquilo. Mas me importava porque eu tinha sempre essa queda para o abismo, para a pedreira do juízo final, graças a problemas específicos que eu possuía e ainda possuo, graças a um erro médico quando eu tinha uns cinco anos de idade...

Porém, não menos importante, o beijo saiu. Uma menina linda, amicíssima de uma de minhas irmãs, que sempre andava por perto de casa, às vezes dentro, tinha um afeto maternal por mim, apesar de sua idade (quase dois anos mais velha), sendo que eu, no primeiro beijo, deveria ter meus dez anos, então tudo bem rs.

Seus cabelinhos lisos que iam até o pescoço; sua pequena estatura como a de uma menina que tinha saído de um programa de criança; seu olhar cativo, e o que mais me impressionava... Sua pele...! Meu Deus do céu, o que era aquilo?! Seus olhinhos de bolinha de gude se arremessando de um lado para o outro, sua graciosidade fêmea, mas a sua pele...!

Não sei mais o que dizer sobre isso. Apenas sobre o beijo. Fortuito, rápido, mensageiro da esperança, liso, nem quente ou frio, breve. Sei o quanto nada significa aos leitores, claro, mas experiências há no mundo que nos fazem vê-lo (o mundo) com mais graça, ou melhor por uma ótica mais simples e bela; e, naquele dia, não sei qual da semana ou do mês, nem mesmo o ano, a Patricinha da Roça, que se escondia em meus sonhos, revelou-se e me deu um beijo... O beijo... O sonho... O roçar da alma (caramba!)... Achei que ia-me casar com ela! Na verdade, para ela só foi mais um entre duzentos que tinha dado em sua legião de coitados...

O Bilhete da Patricinha

Muito anos depois, em minha empreitada estudantil, sem qualquer motivo para ir em busca de beijos ou de meninas (claro que isso na vida de um homem é inédito, então.. é mentira, né), e voltado apenas ao espirito vocacional, sentia-me cansado. Eu, um flagelo do mato, estudava muito, por isso, nada de sentimentos, de paixões, de... Ah, vocês sabem!

Vamos ao assunto. Meus amigos, mais ou menos uns dois com os quais eu andava nos corredores daquele colégio, tinham resolvido me deixar sozinho por alguns dias. Foram jogar bola, paquerar, falar besteiras, invés de colocar em prática nossas lições, ou fazer trabalho escolar... Enfim, o que eu achava de bom à época.

Sentido a falta do sorriso, das brincadeiras dos caras, das conversas fiadas, eu me parecia um pinto abandonado no lixo, e nada melhor do que se sentir assim perto de uma menina linda, cheia de pena e amor para dar. O nome dela era Aline...

Olhos verdes, cabelos loiros curtos, sorriso de cristal, e uma educação de princesa. E pelo jeito, uma dó de mendigo que só!

Queria dizer que não era apaixonado por ela. Sua majestade educacional, seu jeito de ser para com os mortais era só dela, e isso me “incomodava” no sentido de não saber o que sentia por ela; era uma muralha boba que me separava. E talvez esse respeito que tinha para com ela me ajudou a lidar com as mulheres mais tarde...

A verdade é que Aline sabia que não poderia ter nada comigo e vice-versa; mas seu sentimento humano era como o pôr do sol. Todos sabiam que era dela e era lindo. Então, um dia, com aquele sentimento pedreira de suicida que me acompanha nas horas vagas até então, ficou tão visível naquele dia que... Recebi um cartão. Este veio indiretamente pelas mãos de uma amiga que tinha a voz de homem, andado de homem, mas que se tornou professora mais tarde; enfim, Aline tinha dado a ela um cartão para que pudesse me entregar, e ela o fez.

No inicio, não tinha acreditado, mas quando vi que era da princesa intocável, li duzentas e noventa e nove vezes! No cartão, o breve e lindo dizer, “A vida é bela para quem ama, então, ame”.

Não acreditei. Meus olhos berraram de felicidade. Em minha primordial visão, juvenil visão, pura e bela visão, ela era a-pai-xo-na-da por mim. É mole? De uma princesa que não chegava nem perto dos pobres, tornou-se louca de um dia para o outro. Hoje, quando me lembro disso, começo a rir sozinho...


O meu coração à época era um rio intocável, que ao ser visto balançava-se somente com a sombra da lágrima.

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