Ele está lá, no fundo do labirinto, a espera de uma luta quase que justa, na qual ele, a Fera, se sobressaia e se mantenha forte a cada tentativa vã humana em vencê-lo. Lá dentro da sua grande moradia, adormece com apenas um olho, o outro, não, e vívido como uma criança traiçoeira, se prepara para defender seu espaço, com toda juventude que lhe corre nas veias; e de tão poderoso, sorri em gargalhadas, após inúmeras tentativas de combate dos pobres homens, os quais se perdem, se matam ou se fincam como presos eternos de suas garras, fortes e terríveis.
Não há como vencê-lo se não há caminho, se não há coragem, ou um projeto em que se pense em mudança a partir de si mesmo, pois o núcleo natural onde se inicia e morre a dor está dentro de cada um. O animal à espreita, que não dorme, ainda está lá e prefere enfrentar, assim como no mito, o melhor dos homens, ou simplesmente aquele que mergulha em seus ideais e dele não desiste, pois sabe que o monstro real subjaz às virtudes e morais que plantamos diariamente, mas não ao espiritual.
Ele não nos deixa esquecer, porém, dele nos esquecemos; vibramos e nos tornamos heróis provisórios em uma época que precisa se sustentar, se edificar com nossos atos, brilhando como estrelas celestes, nas quais nos referenciamos, mas, ele, o monstro, tão esperto quanto à hiena que espera o leão devorar sua presa e ficar com os restos, a fera, criada por nós, tornou-se o leão e nós a hiena...
Em seu trono inabalável, naquele labirinto magnânimo, feito dos tijolos mais belos e reluzentes pelos arquitetos dos sonhos, se inclina a provocar o homem, dando-lhe vitórias parciais, medalhas por seus feitos, presentes, por detalhes almejados em pequenas consecuções, seus músculos vão se tornando aços inoxidáveis, suas pernas, troncos de sequoias, sua mente, tão poderosa quanto à do mais vilão dos homens...
Mal sabem os homens que a fortaleza desse animal se faz pela distância do próprio homem aos seus valores reais, sobre os quais devia refletir e saber que ele mesmo possui potenciais naturais e incorruptíveis para mudar o mundo, entretanto, sem tais convicções práticas, não saberá jamais que dentro desse campo haverá sempre a volta do monstro se não houver pelo menos a pretensão de conhecê-lo e enfrentá-lo; ou seja, enfrentar a si mesmo.
Destituir o monstro por meio da consciência é o mesmo que ir à lua em sonhos, beber raios do sol em jarras, ou seja, é impossível; já sabemos que ele existe, que se manifesta ante a qualquer tentativa de mudança humana, e por isso nossos atos em relação ao mundo têm dias contados. Não por isso devemos ficar abalados, mesmo porque a guerra, seja no campo dual ou não, se alimenta da pobreza humana, e o monstro não é diferente, pois se eleva e se fortifica à medida que nos lançamos a qualquer feito em benefício social, porque usamos de armas frágeis -- como flechas sem ponta, usamos de vaidosismo, de intelectualismo, de interesses pessoais.
A fera, assim, mais uma vez, bate no peito e diz "podem vir, e preparem as lágrimas de dor".
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