Quando criança, em um quintal cheio de plantações, onde voavam grandes borboletas, pássaros que eu nem conhecia, pela parca sabedoria em relação à natureza, minha mãe me deixava à vontade. Era como um campo dos sonhos, ainda que cheio de matos e capins em que pousavam joaninhas, que pousavam em mim, e eu me deliciava com suas perninhas me fazendo cócegas... era simples, era belo.
Havia um pé de bananeira imenso que me dava medo. De longe, quando eu o via, passava com receio de ele me pegar, levar para dentro e comigo sumir, mas era uma imaginação fértil, daquelas de menino que tem medo de tudo, mas parte pra cima. A prova disso é que me acostumei com o "monstro", e comecei a adentrar naquele conjunto imenso de pés de bananeiras, abraçava-os, sorria e depois corria feito besta...
Era o quintal do qual jamais queria dele sair, pois ele tinha tudo (a meu ver claro), com coisas inexplicáveis como um caminho que nós fazíamos no meio dele para se achegar a um banheiro de madeira, quase destruído, e que, no entanto, era o único a satisfazer nossas necessidade fisiológicas. Hoje penso muito naquele banheiro, pois ir em direção a ele era uma aventura. Havia dias em que eu pegava inclusive um facão do meu pai a desbravar até o infeliz que, com um porta apenas que para fechá-lo se amarrava um prego; não tinha vazo, mas um buraco de dar medo...
Não era problema.
Problema na realidade era o que estava por dentro da família, com seus conflitos naturais, nos quais minha mãe e pai sempre eram os protagonistas, e eu, como personagem pra lá de secundário, no cerrado, corria atrás das borboletas e por elas chorava quando não conseguia alcança-las; mas uma mãe como a minha você não teve. Ela, todas as vezes em que a lágrima saía de meus olhos, corria para sanar aquele fim de mundo. Quando eram as borboletas, pedia aos meus irmãos que pegasse algumas e amarrasse a mais bela em uma linha, na parte inferior do corpo da pequena beleza, e ao voar, minha linha levitava como que por mágica.
Era belo!
Depois eu ficava pensando do porquê as borboletas morriam. Parei de querer que elas fossem minhas. Um dia, era assim, mas depois -- vai compreender cabeça de criança! -- saía para matar todas elas correndo atrás como um louco no meio dos capins-gordura, que, com suas pétalas pontiagudas, me feriam e ficavam em minha roupa me espetando, espetando, até que parei de matar as coitadas...
O quintal tinha mais. Plantações de milho no outono, das quais fazíamos pamonha, mingau, até de noitão. Minha mãe, quando chamava para fazer o amarelão, todo mundo vinha, ajudava, comia, se lambuzava, e eu, na espreita pela rapa da grande panela, pulava em cima da grandona, sobre a qual ninguém tinha poderes, e talvez por isso os pequenos pulavam em cima dela como porcos no cio. Nunca vou me esquecer.
O quintal fica em minha mente como um grandioso ser que nos foi necessário ao crescimento básico de nossas estruturas físicas e mentais; e mais, quando nele penso, reflito acerca do que fui, do que pude conseguir após tantas mazelas pelas quais passei e nunca percebi, somente quando cresci, estudei e conheci pessoas, seres humanos bons e ruins, sem alma e outros com mais alma do que aqueles, enfim, descobri que o grande quintal ainda adormece em mim como tudo que um dia pedi a Deus e hoje não tenho: o amor real à natureza e às pessoas.
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